Estava com saudades deste meu cantinho, aliás, tenho produzido muito pouco, desde que virei livreiro de rua e livreiro virtual. Como livreiro virtual, tenho um espaço onde coloco os meus livros à venda, são livros usados. Ali, na página da Estante Virtual, nomeei o espaço como Banca da Carioca, em homenagem ao local onde trabalho, que é no Largo da Carioca, no corredor, entre a Caixa e o Edifício Central. Sou um livreiro, como diria alguns, onde o povo está. De onde estou, sentado, sou um observador do cotidiano, do movimento incessante de passantes. Tenho visto uma mudança de comportamento, impossível de acontecer em décadas passadas, muitas mulheres de mãos dadas. Dalí, vou deixando a vida me levar, vendendo livros e alguns sonhos, conhecendo pessoas e revendo amigos.
Gosto do Largo da Carioca, é uma das artérias do centro da cidade de grande e agitada movimentação de pessoas e de barulho. Confesso que mesmo tendo o ouvido de mercador, o som produzido no interior daquele espaço, é irritante, pois domina os gritos alucinados dos vendedores de cds, além dos xingamentos entre si, falam palavrão (não sou contra o uso do palavrão) sem nenhuma cerimônia, com muito exagero, brigam e não importam se estejam atendendo ou não.
Naquele espaço onde me localizo, há divisões espaciais, de um lado os pintores, os retratistas, um homem que vende sinos e artefatos de bronze, um mais próximo à banca de jornais, parece que faz leitura divinatória, não reparei, se está sempre por ali. Há o desafinado e chato saxofonista na entrada da Estação do Metrô. Em um extremo, de quem vem da Avenida Rio Branco, há a presença do pessoal do “artesanato” e bijuterias, há também, alguns latinos vendendo artesanato. O Largo da Carioca, é com certeza, um espaço democrático. Estão sempre ali, os bêbados, os pivetes, os mendigos, os carregadores de todo tipo de mercadorias, os montadores das tendas de livros, os vendedores de café/chás, de comida, doces, salgados e outros personagens.
No inicio da noite, um vendedor de sopa que sempre fala a mesma coisa, “ é sopa no mel, tome a sopa e depois o mel, a melhor sopa da cidade”. O vendedor é um homossexual nordestino, sempre de boné virado para trás, estaciona com um imenso carro perto do pessoal do cd, é uma encarnação geral. Sempre aparece por lá, o vendedor de livros jurídicos que é conhecido em toda a cidade como Camarão. O pessoal do cd e os passantes, os que ficam por ali, basta perceberem a presença de Camarão, ele gosta de ser assim chamado, mas faz o maior “mise en scène”, xinga os que o chamam pelo apelido, ameaça a brigar, é uma festa, um agito. Surgem gritos de Camarão por tudo que é canto.Coisa de louco.
O vendedor de livros, Brás, um dos pracistas mais antigo, hoje aposentado e com 80 anos, em processo de decrepitude, passa todo dia para conversar as mesmas coisas comigo, fala muito baixo, que chego a não ouvir o que ele diz. Quando trabalhava para a distribuidora Irradiação Cultural, deixou de falar comigo, por ser um concorrente de seu patrão, na época em que eu tinha uma distribuidora de livros. Como é a vida, sempre o recebo bem, escuto. Sempre tratei colega muito bem, dei empregos para quem tivesse passando por dificuldades, era mixaria, mas acolhia um colega de profissão, penso que fui e sou um profissional solidário, não há ninguém que possa falar o contrário, para confirmar, os colegas que ainda estão no livro, apareceram para me visitar, souberam que eu estava de volta ao livro. Perdi muito tempo de minha vida, por escrúpulos de trabalhar na rua, hoje, não quero outra coisa, claro que hoje com a nova forma de trabalho, a internet, é uma ótima ferramenta, é um bom canal de vendas.
Voltando ao assunto do local onde trabalho, é evidente que há um problema de espaço na Banca do Alberto, foi imposta a um reduzido espaço mínimo, onde mal cabem seis expositores de chão, ou duas pessoas interessadas em ver os livros expostos. Sei que foram tomando o espaço bem maior, disseram para mim, mas Alberto por uma razão interna, acabou concedendo o seu “maior” espaço para dois outros livreiros. Como já tive oportunidade de mencionar neste blog, ali, a família de Vavá, se arvora em dona do pedaço e ocupam a maior fatia daquele “latifúndio”.
Quem estiver ali e for uma pessoa observadora, notará de imediato que há distorções na distribuição do assentamento, nas montagens das “tendas”, há um favorecimento, se foi para beneficiar não sei, mas sei que produziu injustiças. Urge passar por uma nova reformatação do local. Na divisão da família entre si, chegaram ao ponto de possuir uma tenda, apenas para expor uma editora de livros infantis. Que luxo! A metragem do espaço é estabelecida pelos livreiros da família de Vavá e de Domingos que arbitram a metragem a seu bel prazer; para isto, chegam bem cedo, para demarcar a área ocupada. A família de Vavá, ele inclusive, trabalha para a campanha do candidato Lúcio Costa, antigo chefe do Núcleo de Controle Urbano da Prefeitura na área de Coordenação de Licenciamento e Fiscalização. Parece que o órgão tem o objetivo de controlar as ações de ordem urbana na cidade. É no contingente de camelôs, pessoal das feiras livres, etc, que configura o universo onde se locomove o candidato Lúcio Costa (DEM), ali, busca votos. Sua substituta no cargo público, é a esposa Susan Karen de Campos.
Quando ficava abrigado na bancada de Domingos,ele me passava muita informação do local, mas por uma discordância, a quem caberia uma venda,acabei saindo. Assim que cheguei a situação já estava definida, o banco onde Alberto senta, por limitação do espaço de Alberto, acabava ficando no interior do espaço de Domingos. Mais cedo ou mais tarde, comentei com algumas pessoas e com Marilene que isto aconteceria. Ficávamos um ao lado do outro, conversávamos, trocávamos idéias sobre o espaço dos livros, eis que de uma hora para outra, tudo mudou. Uma cliente ao perguntar para mim, se tinha Memórias Póstumas de Brás Cubas, confirmei que tinha; Domingos mais do que de pressa, levantou e foi buscar o livro, fiz uma observação para o afoito, ganancioso, mal educado e ao grosseiro vendedor de livros, alertei, que foi para mim que o cliente havia perguntado, logo a venda seria minha. Esclareci, mesmo se não houvesse venda, teria por principio de responder, até por gentileza ou educação, conduta que rege o meu cotidiano, à pergunta da cliente. Não agi fora da ética, sempre respeitei quando era dirigido a ele, neste caso, não haveria como, se eu tivesse o livro, e deixasse para ele, apenas por estar embaixo da mesma tenda, passar para ele, faria como sempre fiz, se não tivesse o livro, encaminharia para ele.
Ficou irritado dizendo que qualquer venda naquele espaço seria dele. Por aquele espaço ele paga. Por pouco, para evitar polêmicas, não questionei a metragem do espaço, não há nenhuma referência de metragem na licença, logo quem determina e invade, é quem chega primeiro, é quem estabelece a metragem. Alberto, segundo disseram, chegava sempre depois, isto no mundo dos espertos, tem o seu preço. Respondi que por estar ali, e foi perguntado a mim, logo a venda era minha, lembrei para o “ilustre”, aliás, é como gosta de tratar os seus clientes, ora como “ilustre”, ou, “meu rei”. Lembrei que em nenhum momento, quando dirigido a ele, nunca interferi, reconhecia como a venda ter sido efetuada por ele. Neste momento senti com quem estava me relacionando. Domingos é um péssimo sujeito, extremamente repressor, que faz qualquer coisa pelo dinheiro, anda sempre de boné e de mãos para trás, pior que, ainda exibe um discurso religioso (pentencostal) e moralista, alegou por pagar aquele espaço, lhe dá o direito de me expulsar dali., afinal, não só a mim, como Alberto. A esposa Cida, companheira dele, reprime ela o tempo todo, está sempre achando defeitos no que ela faz, é sempre destratada por ele; não concordou com a postura do marido ao me afastar dali. Por discordar do marido, irritada, vai embora e o deixa sozinho. Vi muitas vezes, abandonar a barraca. Ainda voltarei ao assunto...Até breve!