quinta-feira, dezembro 25, 2008

Começo de um balanço final










Voltei para escrever, talvez, o ultimo post do ano. Dar uma geral e preparar a faxina como costumo fazer no final do mês de dezembro. Começo por jogar fora o que escondi embaixo do tapete, arrumar os papéis e livros espalhados, enfim, organizar o caos. No momento, estou predisposto a encarar as tarefas que me incumbi de fazer. Quero dizer que, ainda cabe recurso, posso protelar para qualquer hora ou dia do próximo ano.

Desde que voltei a trabalhar com livros e nesta etapa, como livreiro de rua. Foi uma chance oferecida e pela qual tive oportunidade de agradecer ao livreiro Francisco Olivar, que em verdade, reconheço como incansável trabalhador do livro.
A outra chance e não se deve desperdiçar, foi a que se apresentou com o filósofo nietzscheriano Alberto Pereira - “Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal” - uma proposta logo aceita, de tomar conta de seu pequeno espaço (minifúndio), vender os seus livros, enquanto, fica liberado para outras atividades, como por exemplo, a de livreiro virtual, naturalmente, que em troca colocaria os meus em exposição.
Ali, fiz diversas experiências, inclusive à de acompanhar os valores que Alberto estipulava em seus livros. Depois de resultados insatisfatórios, tive de fazer uma mudança radical, pelas características dos livreiros que me circundam, nenhum deles trabalhariam com livros comprometidos com a cultura libertária. Assim fui à luta, entrei em contato com Rafael, historiador e autor de um importante livro sobre a história do anarquismo, editado e esgotado pela Mauad. Recebi logo em seguida um convite do editor Robson Achiamé para um almoço, seria oportunidade de rever o querido amigo, colocar as conversas em dia, tomar conhecimento dos lançamentos editoriais que pululam na cabeça deste fantástico editor. Admiro muito Robson, um incansável editor, de muitos anos de estrada, muitas vezes superando as curvas perigosas para deslanchar nas retas, mas carregando na bagagem as imensas dificuldades de um pequeno editor em nosso país.
Naquele espaço do Largo da Carioca, estou sentado em uma cadeira que é usufruída por uma turma de bunda mole, todos assentam a buzanfa sem a menor cerimônia, claro que os amigos do cd, há um espaço cativo para eles, cedo para almoçar ou descansar um pouco da longa jornada vendendo cd em pé durante horas. Estou localizado do lado de fora da tenda, fico embaixo da marquise do Edifício Central, no meio da muvuca dos vendedores de cd, deste modo, estou sujeito a pisadas, nem sempre com as devidas desculpas por terem acertado o alvo. A vida que segue.
Meu retorno ao livro, depois que os amigos do livro souberam que estava de volta ao campo de batalha, muitos passaram para uma visita e por conta disto fui à Livraria Martins Fontes, em novo local que não conhecia, recebi as honras da casa, por intermédio de Sérgio, que aliás, conhece tudo de livro. Fomos colegas na Francisco Alves. Para minha alegria revi muita gente nesta nova fase de livreiro de rua. Assim, nesta nova condição vislumbrei o trabalho de venda de livros usados pela internet. Esta novidade foi à diferença. Renasci das cinzas. Hoje estou em três portais de venda de livros, em um deles, também trabalho com cd de músicas. Estou aos poucos galgando uma boa posição no ranking de sebistas, aferido pelo acervo em sua quantidade. Tenho um bom faro por livros de minha área, pudera, fui comprador de 3 livrarias por onde passei, além de ser dono de livraria em Ipanema nos anos 80, do modo que, tenho certa intimidade com a produção editorial publicada no Brasil.
Em minha trajetória no mercado editorial, além de minha bagagem intelectual, traduzida por leituras, auxiliar de pesquisa na faculdade nos anos 70, de minha intenção de estudar e inventariar as editoras de esquerda no Rio de Janeiro, de meus conhecimentos com autores e editores, de uma militância política nos anos 70, esbarro em meu caminho com pessoas totalmente desvinculadas do trabalho com livros, inescrupulosas, diria mesmo ignorantes, sem nenhuma leitura, sem nenhum preparo para lidar com a cultura letrada. São oportunistas, não é a toa que percebo ao analisar o perfil do trabalhador do mercado de livros, um absurdo, uma aberração, alguém que se diz livreiro, "sebista", classificar uma obra de Eça de Queirós como literatura brasileira, sem dúvida, é um atentado ao leitor que procura por uma obra do escritor. Exemplos de erros crassos são encontrados aos montes, até em cartazes que fazem para divulgar eventuais “promoções”, ou descrições como a encontrada: “Somos um cebo virtual que trabalha com vendas de livros usados de todos os generos”. Entendo que todos tem direito ao trabalho, de batalhar pela sobrevivência, mas que pega mal,uma pessoa que trabalha com livros, mal fala, mal escreve e mal lê, no mínimo uma contradição . Em nosso meio, pelo menos aqui em nossa cidade, não há uma escola para preparar, reciclar, oferecer cursos para um profissional do livro. Na verdade, houve um curso oferecido por uma oficina literária no Flamengo; em São Paulo, existe a Unesp. Olha a diferença! Como estou em cada ponto, aumentando um conto, paro para um intervalo, e volto no final do mês para um balanço final.

* Pintura de Tarsila do Amaral

sábado, novembro 15, 2008

Os Anarquistas estão chegando.















Outro dia, ou melhor, vez por outra, ressurge a pergunta inevitável para mim, se acostumei a trabalhar na rua no meio daquela muvuca, cercado dos mais variados sons, do som desafinado do saxofonista, passando pela elevada pressão sonora emitida pelos vendedores de cds e outros agregados, passantes ou não. Para o amigo que me perguntou, respondi que sim. Era a lei da selva, como animal político estava disposto a conviver com a poluição que o ambiente me proporcionava.

Neste momento, sou interrompido por um som, elevado som, provindo de um dos personagens incorporados ao cotidiano da Rua Bitencourt Silva ao lado do Edifício Central, em pleno Largo da Carioca, ali, passa um sujeito diariamente conduzindo rápido e impaciente, um burro-sem-rabo, portando um aparelho de som, tocando um "hit" americano destes que tocam em discotecas, uma bandeira de um clube, que não vale a pena ser mencionado, ou qualquer outra coisa que no momento, não lembro, mas são quinquilharias com certeza... Como cada louco com a sua mania, um outro louco - sempre se encontra um - nem sei se vivemos em uma cidade ou em um hospício, é uma loucura generalizada. Este, seguia, em movimentos frenéticos o ritmo da música. Coisas deste tipo é motivo de frenesi para uma galera atenta, ávida a qualquer movimento estranho...

Depois de ter aderido às vendas de livros pela internet, não estava muito convencido, pelas despesas envolvidas, a permanecer como livreiro de rua. As respostas dos amigos para as minhas hesitações, eram de estímulos a minha permanência, assim, protelei a minha decisão. No entanto, teria que fazer algo, dar uma sacudidela. Como fui distribuidor de livros, com mais de 70 editoras, embora, não tenha conseguido sobreviver, conheci muitos editores. Pelos livros comercializados naquele espaço, teria de procurar algo diferente dos demais livreiros, sou ideologicamente um livreiro de esquerda, é dentro deste campo que circula o meu pensamento, para fazer um diferencial, pensei nos livros sobre anarquismo, sobre a cultura libertária. Pronto! Encontrei o caminho. E fui à luta, fiz contato com Achiamé; fui seu divulgador, pracista e distribuidor. O material do Robson, seria a diferença que eu necessitava para alterar aquele quadro quase que negro. Alea jacta est, foi o que pensei de imediato.

Nesta ocasião conheci o historiador e pesquisador Rafael Dominicis, dali em diante, me foram encaminhadas outras editoras, como a Imaginário, do editor Plínio Coelho, um grande estudioso do anarquismo e tradutor. Fui distribuidor da Editora Imaginário, não conhecia a pequena editora Faísca com suas publicações libertárias. Gostei do catálogo.

É uma opção de trabalho, trabalhosa, reconheço, tanto, que estou ali, comercializando livros usados, apenas demorei muito para fazer esta opção. Às vendas destes últimos meses despencaram, tanto na rua, como na internet.É a crise do sistema capitalista que atinge com mais intensidade determinados segmentos sociais, e o livro dentro de uma hierarquia de valores de consumo como não ocupa um lugar muito privilegiado, é um dos primeiros a ser deixado para trás.A fome de ler é saciada de outra forma.

Em conversa com o meu amigo e parceiro, o Filósofo Alberto Pereira, livreiro da melhor qualidade, anunciei que os anarquistas estavam chegando, ocuparia grande parte da semana em exposição, no mínimo espaço que disponho, alternaria, se fosse o caso com outros tipos de livros, tenho um acervo e preciso girar com este material, fazer promoção.

A linguagem da rua é outra, movida por gritos, sussurros, barulhos e outros que tais. De onde fico, sentado em uma cadeira, que é democraticamente partilhada por várias pessoas, preferencialmente para os vendedores de cds que estão próximos a mim e trabalham em pé na grande parte do dia, cedo de bom grado para eles e aos outros conhecidos. Há sem dúvida, pessoas abusadas que sem nenhuma cerimônia, se apoderam da cadeira, sentam e nem agradecem pela eventual permanência. Quando solicito o lugar, encaram a saída como uma afronta a eles. No espaço da rua são construídos territórios, onde são codificados gestos e linguagens. A linguagem do corpo é uma delas, principalmente aquela em que Drummond lhe dedicou em versos: “Vai feliz na caricia de ser e balançar”. “Esferas harmoniosas sobre o caos.” Bom, fico por aqui, volto a qualquer momento ou em edição extraordinária.

Obs: Para o leitor curioso, o poema está incluído em O Amor Natural, página 25.


domingo, novembro 02, 2008

Ser ou Não Ser, Um livreiro de rua, eis a questão.



















Entre um cochilo e outro, acabei por dar um tempo para escrever como diria alguém, estas mal traçadas linhas. Escrevo para dizer que estou vivo, sacodi a poeira e dei a volta por cima. Diante deste teclado desarrumo minhas idéias e tento juntar palavra com palavra. Da ultima vez que escrevi, narrei a minha nova experiência como livreiro de rua e de livreiro virtual. Alí, de meu observatório em uma simples cadeira branca, sentado vejo o tempo passar e as pessoas, fico bem ao lado dos camelôs de cds em seu pregões diários, cada um grita mais do que o outro em busca da clientela, por conseguinte, da venda. Conheço alguns deles, são gente fina, estão batalhando desde cedo, como um dos mais velhos que ali trabalham, é no decorrer do dia vão surgindo o restante e outros agregados, como vendedores de café, de salgados, de frutas, etc... também uns chatos, verdadeiras malas sem alça, marcam o ponto naquele pedaço.

Os camelôs travam muitas vezes um batalha verbal entre eles, é uma disputa palmo a palmo na conquista de um cliente. Quando fecha o tempo, quer dizer quando chove, há uma mutação dos vendedores, de uma hora para outra, alguns se transformam e passam a oferecer sombrinhas e guarda-chuvas. Qualquer sinal de chuva ou ventania, nós livreiros , ficamos em estado de alerta. É a batalha pela sobrevivência. Nesta selva urbana, no meio desta balbúrdia, estou ali, tentando ganhar uns trocados. Sei que é um trabalho a longo prazo, para isto, ou seja, tenho de trabalhar na rua, implica em muitas vezes em não ter tempo para as leituras que vinha fazendo, um inventário sobre as editoras de esquerda e sua produção editorial.
Não tenho lido muito, o tempo dedicado ao oficio de livreiro virtual me toma mais tempo, além disto, tenho produzido melhor, estou identificado mais neste segmento, do que trabalhar como livreiro de rua. É muito barulho para pouca venda, e o melhor resultado para esta situação, são as pessoas que conheci e revi. Vivaldi, um bibliotecário aposentado, é um deles, conhecia de vista, e tive uma agradável supresa, é simpático, antenado, dono de uma boa cultura, conhece e percebe com a sua sensibilidade o meio livresco, o mundo dos livros em suas nuances. Gosto de levar um papo, aliás, tem sido um bom papo. Francico Olivar foi um dos que revi, conheço por mais de 20 anos, como já disse, é um bom vendedor de livros, batalhador e conhece o oficio, atua em um segmento diferente do meu, trabalha com livros raros, algumas preciosidades; conta com um público cativo e uma clientela atraída pelos saldos que promove. Olivar ainda vende vinil, que não deixa de ser uma alternativa para vendas. Encontrei Antonio Carlos, velho conhecido dos tempos de Eldorado Tijuca, fui colega de Marta, sua irmã em minha fase tijucana; um outro velho conhecido, foi Rizzo, meu gerente quando trabalhei na Interciência, encontrava mais vezes quando tive uma breve passagem pela Beta de Aquárius do livreiro Antonio Seabra. Aos poucos e com o recurso de minha memória volto a falar deste pessoal ligado ao livro ou as Ciências Sociais, dentre eles, o Mestre Aluizio Alves Filho, autor em plena esfervecência, tá produzindo a todo vapor, coisas da melhor qualidade, ainda mais conhece tudo de Monteiro Lobato, publicou um livro que está sempre vendendo, cujo título é As Metamorfoses do Jeca Tatu, editado pela Inverta. Tive contato com Michel Misse, fomos colegas de infância e de militância, tivemos passagem pelo Instituto La-Fayette, velho colégio tradicional da Tijuca.
Voltando à rua, aliás, para sobrevivência dos que ali trabalham, uma boa ferramenta, um bom chamariz, é a promoção de livros, que vai de acordo com o livreiro que promove. Vavá conta com uma vendedora que mantém vínculos de parentescos com ele, me parece uma pessoa legal, seu nome é Vera, irmã de Ana, uma livreira que trabalha junto com a filha. Acho a livreira simpática, mas implica comigo sem mais nem menos, sem motivo concreto. Não sei se Freud explica.
Júlio um outro livreiro, filho de um dos mais antigos livreiros, expõe em outro extremo, tem um bom acervo, vende cd e vinil. Acho Júlio legal, vez por outra dou uma força para ele, para ir almoçar. Domingos na companhia da mulher, nem sei o que vende, aquela área pertence a ele, paga por isto. Se for livro o que ele vende, não deveria, pois há uma enorme incompatibilidade intelectual com que ele supostamente vende e a sua formação rude de parcos conhecimentos, em outras palavras, é extremamente ignorante e de pouca familiaridade com a leitura.
Algum tempo atrás foi reclamada, uma suposta invasão, em uma simples tradução de seu gesto, foi uma ampliação de seu espaço, que motivou a presença de zelosos guardas municipais. Neste episódio pude observar que as delimitações espaciais não é declarada na licença e o que o inescrupuloso vendedor, estava blefando, utilizava o espaço a seu bel prazer.

Perdido entre os "grandes vendedores de livros", está o Filósofo Alberto, não é um nefilibata, é um silencioso livreiro, também batalhador, localizado em um mini-espaço, mas que de livro em livro vai levando a vida. É com Alberto que divido as tarefas diárias de um vendedor de livros. Estou ali, não muito convicto de que vale a pena, sinto que hoje, sou um livreiro mais para a web do que para a rua. A carcaça não ajuda muito, sinceramente o trabalho em casa, é todo dia e toda hora, não há restrições...cerceamento de qualquer espécie, faça chuva ou sol, pode pintar os pedidos. A chuva é a inimga cordial do trabalhador de rua, de modo que assim , em casa, no chamado lar doce lar, não estou sujeito as intempéries do dia; um outro batalhador do livro é Márcio, tem o seu espaço colado ao de Alberto e Vavá, é um bom camarada, quebrou meu galho quando trabalhei com Olivar, ajudava a armar aquelas bancas, digo que foi bem camarada e solidário.Cada livreiro atua em sua área de predileção, no meu caso, por identificação de formação, não fico ligado ao best-seller.
Amadureço a idéia, pois sinto-me mais gratificado vendendo para um cliente de qualquer ponto do país, do que ficar ali, sujeito ao movimento do dia, envolvido em uma poluição sonora e ambiental, o cheiro que exala das caixas de esgoto, é um odor terrível e desagradável. Na verdade, tenho pago para trabalhar, os custos são maiores que a venda, mas a companhia do Alberto, mesmo calado é estimulante. Alberto, uma das identificações que tenho com ele, é que conhece o mercado livreiro e entende de livros. Para ficar ali na rua, tive de abdicar temporariamente de minha pesquisa sobre mercado editorial, talvez seja o unico, atuando no livro pelo menos no Rio de Janeiro e interessado em pesquisar sobre o mesmo , aliás, em outro nível, com outro status, já no âmbito da academia, há o pesquisador-professor e ex-livreiro Aníbal Bragança, foi dono de uma das melhores livrarias das Terras de Araribóia, um grande promotor de eventos sobre mercado editorial, dono do blog Ler, escrever e contar aliás, sempre vale a pena uma consulta, claro se a alma não é pequena.
Voltando ao meu interesse de pesquisador, ou qualquer coisa nestes sentido, o que circulava pelas editoras, lá pelo idos de 60 e 70, era o que chamava atenção quando estudante e militante político ( base universitária) fui do Partidão(PCB). Freqüentador das poucas livrarias (hoje todas fechadas) que existiam e das feiras de livro, vibrava com os lançamentos, uma delas era a Editora Civilização Brasileira, do grande editor Ênio Silveira, com fortes ligações com o Partidão; a outra, era a Vitória, uma editora ligada ao Partido, que teve um período sob o comando de Leôncio Basbaum, enquanto esteve ligado ao PCB., mais tarde Leôncio criou a sua própria editora a Edaglit. Das editoras de esquerda, fui trabalhar em duas delas, a Paz e Terra, tinha uma familiaridade com o seu catálogo, atuei junto ao editor Fernando Gasparian como divulgador editorial nos anos 70, depois, retorno para trabalhar com o seu filho, Marcus Gasparian, no final dos anos 80 até meados dos anos 90. Não posso deixar de mencionar a Edições Graal, que foi do deputado cassado Max da Costa Santos, mais tarde adquirida por Gasparian. Nesta editora trabalhei com André, filho de Max e com Paul Christoff. Havia a Zahar, por pouco não fui divulgador da editora, conhecia Jorginho Zahar, filho do também grande editor Jorge Zahar, mas acabei ficando com a Brasiliense, peguei uma fase de mudança editorial, como divulgador no Rio, dentro da universidade da coleção Primeiros Passos. não conheci o filho de Caio Prado Jr, o editor Caio Graco, na ocasião trabalhei para a Distribuidora Quadrelli, de Newton Quadrelli que o representava, trabalhei no Rio; para a Alfa-Ômega, através da Vários Escritos de Armando Nagata, não conheci Fernando Mangarielo, atuei como divulgador da Hucitec, conheci Flávio Aderaldo e Adalgisa Pereira, Achiamé uma pequena e boa editora que despontava no mercado com títulos de qualidade, atuei junto ao Robson Achiamé , preciso interromper, bom isto é papo para outra hora, volto a conversar a qualquer momento ou em edição extraordinária. Um abraço.

domingo, setembro 14, 2008

Um Observador do Cotidiano, Um Outro Olhar.














Estava com saudades deste meu cantinho, aliás, tenho produzido muito pouco, desde que virei livreiro de rua e livreiro virtual. Como livreiro virtual, tenho um espaço onde coloco os meus livros à venda, são livros usados. Ali, na página da Estante Virtual, nomeei o espaço como Banca da Carioca, em homenagem ao local onde trabalho, que é no Largo da Carioca, no corredor, entre a Caixa e o Edifício Central. Sou um livreiro, como diria alguns, onde o povo está. De onde estou, sentado, sou um observador do cotidiano, do movimento incessante de passantes. Tenho visto uma mudança de comportamento, impossível de acontecer em décadas passadas, muitas mulheres de mãos dadas. Dalí, vou deixando a vida me levar, vendendo livros e alguns sonhos, conhecendo pessoas e revendo amigos.
Gosto do Largo da Carioca, é uma das artérias do centro da cidade de grande e agitada movimentação de pessoas e de barulho. Confesso que mesmo tendo o ouvido de mercador, o som produzido no interior daquele espaço, é irritante, pois domina os gritos alucinados dos vendedores de cds, além dos xingamentos entre si, falam palavrão (não sou contra o uso do palavrão) sem nenhuma cerimônia, com muito exagero, brigam e não importam se estejam atendendo ou não.
Naquele espaço onde me localizo, há divisões espaciais, de um lado os pintores, os retratistas, um homem que vende sinos e artefatos de bronze, um mais próximo à banca de jornais, parece que faz leitura divinatória, não reparei, se está sempre por ali. Há o desafinado e chato saxofonista na entrada da Estação do Metrô. Em um extremo, de quem vem da Avenida Rio Branco, há a presença do pessoal do “artesanato” e bijuterias, há também, alguns latinos vendendo artesanato. O Largo da Carioca, é com certeza, um espaço democrático. Estão sempre ali, os bêbados, os pivetes, os mendigos, os carregadores de todo tipo de mercadorias, os montadores das tendas de livros, os vendedores de café/chás, de comida, doces, salgados e outros personagens.
No inicio da noite, um vendedor de sopa que sempre fala a mesma coisa, “ é sopa no mel, tome a sopa e depois o mel, a melhor sopa da cidade”. O vendedor é um homossexual nordestino, sempre de boné virado para trás, estaciona com um imenso carro perto do pessoal do cd, é uma encarnação geral. Sempre aparece por lá, o vendedor de livros jurídicos que é conhecido em toda a cidade como Camarão. O pessoal do cd e os passantes, os que ficam por ali, basta perceberem a presença de Camarão, ele gosta de ser assim chamado, mas faz o maior “mise en scène”, xinga os que o chamam pelo apelido, ameaça a brigar, é uma festa, um agito. Surgem gritos de Camarão por tudo que é canto.Coisa de louco.
O vendedor de livros, Brás, um dos pracistas mais antigo, hoje aposentado e com 80 anos, em processo de decrepitude, passa todo dia para conversar as mesmas coisas comigo, fala muito baixo, que chego a não ouvir o que ele diz. Quando trabalhava para a distribuidora Irradiação Cultural, deixou de falar comigo, por ser um concorrente de seu patrão, na época em que eu tinha uma distribuidora de livros. Como é a vida, sempre o recebo bem, escuto. Sempre tratei colega muito bem, dei empregos para quem tivesse passando por dificuldades, era mixaria, mas acolhia um colega de profissão, penso que fui e sou um profissional solidário, não há ninguém que possa falar o contrário, para confirmar, os colegas que ainda estão no livro, apareceram para me visitar, souberam que eu estava de volta ao livro. Perdi muito tempo de minha vida, por escrúpulos de trabalhar na rua, hoje, não quero outra coisa, claro que hoje com a nova forma de trabalho, a internet, é uma ótima ferramenta, é um bom canal de vendas.
Voltando ao assunto do local onde trabalho, é evidente que há um problema de espaço na Banca do Alberto, foi imposta a um reduzido espaço mínimo, onde mal cabem seis expositores de chão, ou duas pessoas interessadas em ver os livros expostos. Sei que foram tomando o espaço bem maior, disseram para mim, mas Alberto por uma razão interna, acabou concedendo o seu “maior” espaço para dois outros livreiros. Como já tive oportunidade de mencionar neste blog, ali, a família de Vavá, se arvora em dona do pedaço e ocupam a maior fatia daquele “latifúndio”.
Quem estiver ali e for uma pessoa observadora, notará de imediato que há distorções na distribuição do assentamento, nas montagens das “tendas”, há um favorecimento, se foi para beneficiar não sei, mas sei que produziu injustiças. Urge passar por uma nova reformatação do local. Na divisão da família entre si, chegaram ao ponto de possuir uma tenda, apenas para expor uma editora de livros infantis. Que luxo! A metragem do espaço é estabelecida pelos livreiros da família de Vavá e de Domingos que arbitram a metragem a seu bel prazer; para isto, chegam bem cedo, para demarcar a área ocupada. A família de Vavá, ele inclusive, trabalha para a campanha do candidato Lúcio Costa, antigo chefe do Núcleo de Controle Urbano da Prefeitura na área de Coordenação de Licenciamento e Fiscalização. Parece que o órgão tem o objetivo de controlar as ações de ordem urbana na cidade. É no contingente de camelôs, pessoal das feiras livres, etc, que configura o universo onde se locomove o candidato Lúcio Costa (DEM), ali, busca votos. Sua substituta no cargo público, é a esposa Susan Karen de Campos.
Quando ficava abrigado na bancada de Domingos,ele me passava muita informação do local, mas por uma discordância, a quem caberia uma venda,acabei saindo. Assim que cheguei a situação já estava definida, o banco onde Alberto senta, por limitação do espaço de Alberto, acabava ficando no interior do espaço de Domingos. Mais cedo ou mais tarde, comentei com algumas pessoas e com Marilene que isto aconteceria. Ficávamos um ao lado do outro, conversávamos, trocávamos idéias sobre o espaço dos livros, eis que de uma hora para outra, tudo mudou. Uma cliente ao perguntar para mim, se tinha Memórias Póstumas de Brás Cubas, confirmei que tinha; Domingos mais do que de pressa, levantou e foi buscar o livro, fiz uma observação para o afoito, ganancioso, mal educado e ao grosseiro vendedor de livros, alertei, que foi para mim que o cliente havia perguntado, logo a venda seria minha. Esclareci, mesmo se não houvesse venda, teria por principio de responder, até por gentileza ou educação, conduta que rege o meu cotidiano, à pergunta da cliente. Não agi fora da ética, sempre respeitei quando era dirigido a ele, neste caso, não haveria como, se eu tivesse o livro, e deixasse para ele, apenas por estar embaixo da mesma tenda, passar para ele, faria como sempre fiz, se não tivesse o livro, encaminharia para ele.
Ficou irritado dizendo que qualquer venda naquele espaço seria dele. Por aquele espaço ele paga. Por pouco, para evitar polêmicas, não questionei a metragem do espaço, não há nenhuma referência de metragem na licença, logo quem determina e invade, é quem chega primeiro, é quem estabelece a metragem. Alberto, segundo disseram, chegava sempre depois, isto no mundo dos espertos, tem o seu preço. Respondi que por estar ali, e foi perguntado a mim, logo a venda era minha, lembrei para o “ilustre”, aliás, é como gosta de tratar os seus clientes, ora como “ilustre”, ou, “meu rei”. Lembrei que em nenhum momento, quando dirigido a ele, nunca interferi, reconhecia como a venda ter sido efetuada por ele. Neste momento senti com quem estava me relacionando. Domingos é um péssimo sujeito, extremamente repressor, que faz qualquer coisa pelo dinheiro, anda sempre de boné e de mãos para trás, pior que, ainda exibe um discurso religioso (pentencostal) e moralista, alegou por pagar aquele espaço, lhe dá o direito de me expulsar dali., afinal, não só a mim, como Alberto. A esposa Cida, companheira dele, reprime ela o tempo todo, está sempre achando defeitos no que ela faz, é sempre destratada por ele; não concordou com a postura do marido ao me afastar dali. Por discordar do marido, irritada, vai embora e o deixa sozinho. Vi muitas vezes, abandonar a barraca. Ainda voltarei ao assunto...Até breve!

terça-feira, agosto 26, 2008

Agradeço ao Livreiro Alberto Pereira, o Filósofo


Estou como vocês perceberam, ausente deste blog e do outro. O outro para quem não sabe, é o blog Esquinas do Tempo, um espaço que criei para escrever o que vier na telha; também desempenho vez por outra, o papel de colaborador com comentários sobre a política do Vasco, clube pela qual torço, no site Supervasco. Se quase não tenho tempo para um, quanto mais para escrever em três, o tempo ficou escasso, pois no momento, me transformei em livreiro de rua e livreiro virtual, atividade que tenho curtido muito.
Minha passagem junto ao livreiro Vavá foi efêmera e decepcionante, da empolgação inicial e o agradecimento pela oportunidade de voltar ao livro, sem dúvida, reconheço e mantenho meu agradecimento. Com o decorrer da convivência pude perceber claramente o comportamento dúbio, claudicante, escorregadio do livreiro Vavá, acrescentaria também, a dificuldade que tem de cumprimentar alguém, percebo que há ausência total no trato urbano. Acho muito deselegante, na convivência com outro colega de trabalho, o sujeito, não se dignar a cumprimentar, dar um Bom dia, ou, até mais...Acrescento o hábito deselegante de, sem mais nem menos, deixar a pessoa falar sozinha, que dizer, sai da conversa sem comunicar nada, simplesmente sai, quando notam, sumiu. A falta de compromisso com o outro, é a linguagem permanente de comunicação em seu cotidiano. Vi pessoas que ele marcava para comprar livros, aparecerem na hora combinada, ele como parte interessada, não comparecia. Um vez "combinou" com um livreiro morador de Santa Teresa para comprar seus livros, o homem veio com duas enormes e pesadas sacolas, quando ali chegou, constatou que Vavá sumira, deixou o cara a ver navios, o homem (César - descobri mais tarde em conversa com o próprio, o seu nome) ficou possesso, dizendo que gastou com passagem para nada.Para mim, não me comunicou nada, respondi e fiquei tão perplexo quanto, só não fiquei irado como o homem da sacola.
Pelo tempo de trabalho com livros, Vavá formou uma boa clientela, um segmento de leitores dos quais muitos gostam de comprar livros por um real. Ali, entra tudo, desde livros sem capa, com defeito, faltando páginas, qualquer livro sobre qualquer assunto, são despejados naquele espaço.Tem sido a promoção permanente que faz em sua bancada. O convidativo preço, não diria, a preço de banana, pois a fruta está cada vez mais cara, pois superou o valor de um real, que hoje é vendida, ainda mais a peso e não à dúzias como se comprava no passado.
Talvez, tenha me precipitado ao qualificar sua composição no perfil de livreiro, cabe mais a de vendedor de livros, um bom vendedor de livros, trabalhador, pega no pesado, sempre com a carga nobre prá lá e prá cá. Vava´se autoproclama um conhecedor da vida de Monteiro Lobato, pode até ser. Aliás, vende esta idéia de pesquisador da obra de Monteiro Lobato, de ter o maior acervo sobre Monteiro Lobato. Não fiquei muito convencido, para mim, a impressão que tive, foi um conhecimento envernizado da biografia de Monteiro Lobato, aliás desconheço qualquer trabalho de cunho intelectual provindo do livreiro Vavá. Em seu curriculum acrescenta a de escritor infantil, publicou e encontra-se esgotado um livro infantil cujo título é Risadinha, montou uma livraria em sua terra natal, é membro da Academia Cearense.
Percebi quando comentei, que não sabia que Monteiro Lobato, foi quem apresentou em 1944, Ênio Silveira um estudante de Sociologia a Octalles Marcondes Ferreira, ex-sócio de Monteiro Lobato, na ocasião, Octalles era dono da Companhia Editora Nacional (CEN) que veio no futuro a ser sogro de Ênio, que casa com Cléo Marcondes Ferreira. Octalles convidou para trabalhar na Companhia Editora Nacional, mais tarde, entregou a Civilização Brasileira, que havia comprado em 1932, de um grupo, dentre eles, os sócios: Gustavo Barroso, escritor integralista, o livreiro integralista Getúlio M. Costa, o escritor Ribeiro Couto e o jornalista Hildebrando de Lima, irmão do poeta Jorge de Lima. A mudança de perfil da editora Civilização, acontece quando Ênio Silveira em 1951 ao voltar de viagem feita aos Estados Unidos, foi fazer um curso de editoração com Alfred A. Knopf. Voltarei ao assunto em uma próxima oportunidade, mas voltando ao "livreiro" Vavá...
Acho mesmo que os personagens de sua predileção não são os do Sitio do Picapau Amarelo e sim do escritor italiano Carlo Collodi, do velho carpinteiro Gepeto, do Grilo Falante, etc... Vavá foi para o Ceará, ficou ausente por mais de um mês, quando voltou, empregou a cunhada, antes deixou a filha, uma adolescente para tomar conta da bancada. O grande estoque que dizia ter, não foi mostrado; quando voltou de viagem, muito pouco livro foi oferecido pra vender. Nem alimentou a filha com livros durante a sua ausência. Notava-se à distância, falta de material, o que veio a confirmar quando voltou a exibir uma baixa oferta. Não tocou uma palavra sequer do que foi combinado, ou seja, ao voltar, eu reassumiria a minha função de vendedor. Não pretendo me prolongar no assunto, encerro, aqui.
De repente me vi, de imediato para aonde ir? Eis que surge, a presença do livreiro-filósofo Alberto Pereira, dono de um espaço, de um mini-espaço, vizinho ao de Vavá, que abriu generosamente um espaço para este livreiro expor seus livros, aproveito para tornar público meu agradecimento a Alberto Pereira, filósofo formado pela UERJ, e pela Livraria do Povo, uma pequena livraria localizada na esquina da Rua México, com Araújo Porto Alegre, que foi criada pelo antigo livreiro-gerente da Leonardo Da Vinci, George, que mantinha simpatia pelo MR8.
O livreiro Alberto foi quem acolheu este sociólogo por formação e livreiro. O diálogo com Alberto, o Filósofo flui com mais facilidade, conhece os livros, e é um leitor. Ali, foi o meu pontapé inicial para me transformar em livreiro virtual, faço parte da comunidade de livreiros que trabalham com livros usados na internet, em uma página que abriga sebistas de todo o país, o badalado site Estante Virtual, ali, me transformei em Banca da Carioca.
Naquele espaço identificado como tenda cultural, abriga um grupo de livreiros, um destes grupos, é comandado por uma familia que dividiu o espaço público ao seu bel prazer, que inclui o vendedor de livros Francisco Olivar, em uma ponta, há o livreiro Júlio, cujo pai é do ramo e atua há décadas com livros, um senhor bem idoso; em outro extremo, há a presença de Domingos, sempre de boné, um "livreiro", iniciado em uma livraria, na época, uma das poucas livrarias do Méier, na Dias da Cruz, a livraria Panno, que priorizava a venda de jornais e revista, aliás, esta é a sua origem. Domingos se revelou amigo, ficou contente em saber de minha história, lembramos que nos conhecemos quando trabalhei como pracista da Paz e Terra, mas revelou sua face, tirou a sua máscara e em pouco tempo, mostrou ser um "colega" extremamente individualista, sem ética. De baixa instrução, aliás, uma das características do pessoal de livraria, sua base intelectual é apoiada em um índice muito baixo de informação. Monocórdico ao divulgar os livros de sua banca, repete sempre: "Está sempre chegando novidades, tem sempre novidades, todo dia tem novidades". O quem vem a ser novidade em um banca com livros usados? Qualquer titulo pode ser considerado como novidade. Outro dia, cometeu um grande equívoco, fui testemunha, uma cliente pediu um livro de Freud, ele apresentou um livro sobre Freud, a moça ao ver o livro dispensou, disse que ela perguntou se tinha um livro de Freud, eu mostrei, ficou irritado, mas só percebeu o engano, quando chamei a sua atenção para o livro, que era sobre Freud e não do autor, ficou sem graça."Trata os clientes como ilustre, ou meu rei" com uma entonação de um baiano.
Domingos relaciona com clientela muitas vezes de modo brusco, rude, chamando atenção dos incautos clientes que por ventura abram o livro do modo em que ele não gosta, chega a advertir o cliente contra o modo com que manuseia as folhas do livro.
Atualmente parte do grupo de "livreiros" fazem a campanha de um candidato a vereador, uma das mulheres da familia Gários, chegou a propor recolher grana para a campanha do candidato Lúcio Costa, lembro que Alberto rechaçou de imediato em colaborar, o pequeno grupo no momento distribui santinhos, e expõe um banner na rua. Os livreiros não se engajam claramente, deixam por conta de zelosos e dedicados funcionários tal militância.
Volto a conversar sobre livros, tenho de ir à luta e sem pedir licença. A imagem exposta neste post, foi o logo de minha livraria, aproveitada na distribuidora e agora resgatada para vincular a imagem exibida, com a minha identidade de livreiro de rua e livreiro virtual. Um abraço e até breve.

domingo, julho 06, 2008

As Editoras de Esquerda: Civilização Brasileira e Paz e Terra


O meu interesse em escrever sobre a indústria editorial, ou sobre livrarias, vem de longa data. Aliás, vez por outra, são feitos alguns registros nas páginas deste blog. A escolha do meu universo de pesquisa foi reforçado durante a minha trajetória como profissional do livro, trabalhei preferencialmente em editoras consideradas de esquerda, de oposição ao regime militar, intalado em nosso país, a partir de 1964.
Quando fui pracista da Editora Paz e Terra e Graal por mais de 4 anos, havia um reconhecimento por parte do mercado livreiro, que percebia em mim, uma forte identificação com a Paz e Terrra. Em tempo, era também, leitor das editoras, enquanto estudante, conhecia os livros publicados, alguns dos editados foram meus professores, como: Leda Barreto, autora de Paz na Terra, com o selo da Paz e Terra e Julião, Nordeste, Revolução, editado em 1963 pela Civilização. ou colegas do curso de Ciências Sociais, como José Ricardo Ramalho, autor de Mundo do Crime - A Ordem pelo Avesso, sua tese de mestrado, defendida em 1978, com orientação de Ruth Cardoso, editada em 1979 pela Graal.
Minha vontade de trabalhar com livros foi manifestada a partir de uma queima de livros promovida no final dos anos 60 pela Livraria e Editora Civilização Brasileira, que foi ampliada para rede de livraria Entrelivros e as feiras de livros que circulavam pelas praças da cidade. Os livros em promoção em grande parte foram os editados pela Civilização Brasileira, havia nesta queima: as Revistas: Civilização Brasileira, conhecidas como RCB, Politica Externa Independente, lançada apenas três números, Revistas da Paz e Terra, os livros em formato de bolso da série "Violão de Rua" - Poemas para a liberdade, que fazia parte da Coleção Cadernos do Povo Brasileiro, um dos projetos do Centro Popular de Cultura da UNE, era os meus primeiros contatos com a poesia engajada; os livros da BUP - Biblioteca Universal Popular que era financiada com a prestimosa colaboração do banqueiro José Luiz de Magalhães Lins. A BUP ficava sediada no terceiro piso da editora Civilização Brasileira, na rua Sete de Setembro, 97. Passava por várias vezes na Civilização, haviam livros que entravam em promoção ou em reposição; comprei O Capitalismo no Século XX, de autoria de Eugene Varga e outros livros descritos em posts passados. Os Cadernos do Povo Brasileiro faziam parte de minha biblioteca, os vários livros de Nelson Werneck Sodré, os livros de Gramsci (Os Intelectuais e a Organização da Cultura, Maquiavel, a Politica e o Estado Moderno, Cartas do Cárcere, Literatura e Vida Nacional, Concepção Dialética da História).
Naquela ocasião travei conhecimento com os livros da Paz e Terra, uma editora oriunda da Civilização Brasileira, como selo. Vivenciava uma fome de ler. Lembro de ter comprado Canto Melhor - Uma perspectiva da poesia brasileira, de autoria do ex-diretor do Instituto Nacional do Livro do Rio Grande do Sul, Manoel Sarmento Barata (1955-1960), que fazia parte da Coleção Série Estudos sobre o Brasil e a América Latina, editado em 69. O livro Educação e Revolução, de autoria de Lucio Lombardo Radice; um livro editado pela Fulgor em 1963, de autoria do pedagogo argentino Anibal Ponce "Educação e Luta de Classes", editado muito tempo depois pela Cortez. Menciono mais sobre a Civilização em um post datado de maio de 2007.
Uma combinação entre a minha postura ideológica com a produção editorial da Paz e Terra, compunha esta imagem. Confesso que perdi as várias oportunidades de entrevistar os editores, como Fernando Gasparian (1930-2006), ou Jorge Zahar (1920-1998), ou Ênio Silveira (1925-1996), ou os livreiros Lucien Zahar (1925-1998) com este, eu conversava muito, gostava de ouvir suas histórias sobre a trajetória da familia Zahar e sobre o mercado editorial, transpirava livros, da Livraria Galáxia ou Ernesto Zahar, da Livraria Ler, que apenas cumprimentava. Estes personagens são importantes no panorama editorial do Rio de Janeiro e do país, deram enorme contribuição à industria e o comércio do livro. Ênio Silveira não cheguei a conhecer, mas freqüentei como já apontei nestas páginas algumas vezes a Livraria Civilização Brasileira, na rua Sete de Setembro, 97 que na parte externa da livraria, na parede havia um enorme cartaz uma frase de Malba Tahan: "Quem não Lê, mal ouve, mal fala, mal vê", representada por três macacos.

Civilização Brasileira, Paz e Terra e Editorial Vitória, são dentre algumas representantes da produção intelectual da esquerda brasileira e localizadas no Rio de Janeiro; não defini o período, no entanto, tenho lido, para melhor compreensão, a partir da compra da Revista do Brasil, em 1918, surge a Editora Monteiro Lobato e Cia; passando pela Companhia Editora Nacional, criada em 1925 por Monteiro Lobato (1882/1948) que promoveu verdadeira reviravolta no mercado livresco, em sociedade com Octalles Marcondes Ferreira (1899//1972) de enorme contribuição. Para fazer qualquer leitura sobre o mercado editorial brasileiro, não se pode perder de vista a importância destes editores.
Outro dia, em conversa com Paulo Adolfo, um dos diretores da Editora Brasil-América (EBAL), uma das mais importantes editoras de histórias em quadrinhos de nosso país, fundada em 1945 por seu pai, o editor Adolfo Aizen, sugeriu que tivesse o Rio de Janeiro como fio condutor de minha pesquisa. Pelo caminho que estava tomando, fiquei convencido que ficaria muito abrangente, examinaria as editoras surgidas ou desaparecidas em diversos estados, na verdade, nem sei se daria conta, pois precisaria de um suporte que não disponho, sem dúvida, uma limitação para empreender tamanha tarefa.
A Paz e Terra foi adquirida por Fernando Gasparian de Ênio Silveira, a Paz e Terra fazia parte da Editora Civilização Brasileira. No obituário que li, em alguns deles, há referência que Fernando Gasparian foi quem fundou a Paz e Terra, um equívoco, a editora foi criada no interior da Civilização Brasileira, iniciando como Revista Paz e Terra em julho de 1966 e havia uma enorme participação do poeta Moacyr Félix, também editor e organizador de revistas e antologias. O sociólogo Waldo César, foi diretor da Revista Paz e Terra no período de 1966-1968. Quero deixar claro que não existiram apenas as editoras citadas como de esquerda.
*Continua na próxima oportunidade

domingo, junho 22, 2008

De volta ao livro, um agradecimento ao livreiro Francisco Olivar


















Demorou! Agora estou de volta ao mundo dos livros, em especial ao comércio de livros usados, melhor ainda, a onde o povo está, ou seja, na rua, em um dos espaços de maior muvuca, localizado no coração da cidade, onde transitam desde engravatados, senhoras elegantes, estudantes, enfim, há diversos tipos de passantes; se me pedirem algum dado estatístico de quantas pessoas passam pelo local, confesso, que não disponho de nenhum. Só em olhar o agitado movimento das pessoas, percebi que há muito esbarrão entres as pessoas, que vão de encontro umas com as outras, nem sequer, ouve-se um pedido de desculpas, claro que há pessoas que fazem de propósito.
Ouvir o barulho de tudo que é som, desde de um saxofonista, que me parece desafinado,o artista é dono sem dúvida de um repertório com pouca variação sonora, chega a ser constrangedor, mas ganha a vida desta maneira, cada um, se vira como pode, e assim deve ser.
Ter um emprego formal, está cada vez mais difícil, as oportunidades se estreitam na medida em que você envelhece. Claro que esta situação vai muito além, envolve outros valores, em que a projeção do jovem, a beleza de alguma forma, são apresentações indispensáveis para o recrutamento da mão-de-obra. Acho que deve se apostar no jovem, em qualificar o profissional, no momento, ele é hoje, mas amanhã, pela passagem do tempo, passa a ser ontem, torna-se mais velho, as rugas e os cabelos brancos, são registros do tempo, daí em diante, o estigma, a exclusão, a marginalidade.

Pela parte da manhã, antes das 8 horas, já estou na luta sem pedir licença, neste caso, há suas compensações, por exemplo, compondo a paisagem sonora, para quem trabalha ou passa por aquele trecho, somos brindados com a presença de um tocador de rebeca, além de bem intencionado, alguns dizem que desafina, mas infelizmente, oferece pouca variação, toca apenas música clássica, acredito que sejam as mais conhecidas.
Durante a semana, a Avenida Rio Branco convive geralmente, com o caótico trânsito de ônibus, motos, bicicletas, transeuntes e automóveis com as suas insuportáveis buzinas, além dos apitos estridentes com o firme propósito de desorganizarem o caos. Avenida Rio Branco sem a presença das diversas manifestações de protestos com os seus mais variados protagonistas, não seria a mesma.É a artéria pulsante da avenida, que aliás, é uma via que serve de tremendo palco para qualquer tipo de manifestação, que muitas vezes, são reforçadas por possantes caixas de som, para dar ao falante, a certeza de quanto mais ele gritar, soltar a voz, será ouvido pelos passantes e fará vibrar a categoria sindical que eles representam.
Para implementar a freqüência sônica, estou rodeado por todo tipo de som, o mais irritante, é a infernal gritaria dos vendedores de cds/dvds e programas de computador. Desde cedo, por volta de 8 horas, vai chegando a turma, há um bom números de pessoas, não identifiquei a presença de mulheres neste tipo de trabalho, a grande maioria, são de homens, na faixa de 20 e 30 anos, oferecendo os mais variados produtos,quer dizer programas, no entanto, quero registrar que há uma incessante repetição em um ritmo, só comparável aos papagaios, acho que sofrem de psitacismo, mas parece ser a voz o melhor instrumento de vendas, cada um instrumentaliza a voz como pode, então, que assim seja.
O certo é que existe uma poluição sonora, que pode ser observada ou ouvida, se caminharmos em direção ao interior do Largo da Carioca. São sons produzidos por outros vendedores, pregadores religiosos, ruídos diversos, que revela a expressão musical da sinfonia caótica que toma conta da paisagem urbana dos grandes centros. Percebi que qualquer tipo de cidadão se acha no direito de mostrar a voz, gritar, assobiar, rir em tom elevado. Há alguns passantes que pegam carona na música tocada pelo saxofonista e dão de cantar. Outro dia, passou um sujeito bêbado, tipo mendigo, cantando músicas românticas.

Tenho observado pessoas que saem da Estação em tremenda disparada, achei estranho, depois percebi que era para pegar a tempo, o sinal aberto para elas atravessarem a pista.
Há um lado bom nesta história que é a minha volta para trabalhar com livros, para isto, tenho de agradecer a um velho companheiro de batalha, hoje, um vendedor de livros na rua. Francisco Olivar, o Vavá, é mais do que um vendedor, é um livreiro, à moda antiga, destes que conhece o assunto, a capa, a impressão, autor e o valor de um livro. Formado na velha e tradicional livraria , que por sinal sobram poucas, foram estes espaços que viabilizaram o surgimento do profissional do livro, que utilizam o recurso da memória como registro e ferramenta de trabalho. Trabalhar em sebo, ou livro usado é no meu entendimento, um bom espaço na formação de um livreiro, uma boa escola. O aprendizado de Vavá foi também no dia a dia de uma livraria, deste contato físico, despertou a paixão pelos livros e por Monteiro Lobato. Entre nós, profissionais do livro, circula a informação de que Olivar é dono de um grande acervo das obras de Monteiro Lobato e sobre Monteiro Lobato, tanto que este cearense, incentivador também da cultura de sua terra natal. Vavá é convidado para dar palestras sobre o homem que promoveu a maior revolução editorial do país, o grande editor e escritor José Bento Monteiro Lobato. Além de vender as preciosidades, tenta arrumar os pedidos dos clientes. A banca de Vavá, é uma mina. A conduta para quem gosta de comprar livros, é a de ficar garimpando, há grandes possibilidade de achar livros raros, além disto, são baratos, ainda arruma um tempo para participar de uma Academia Cearense de Letras e ser leitor de vários jornais.
Olivar é um homem simples.
Vavá é um homem preocupado com a divulgação da cultura, mantém um relacionamento com clientes, em sua maioria idosos, são jornalistas, escritores, politicos, uma gama variada de outros profissionais, está há mais de 10 anos, em uma das bancadas, vende livros a 1,00 real, ainda bem que escapou desta praga de 0,99 centavos. Em sua banca de livros, há aqueles que são cativos, estão sempre ali, para um papo, agora também comigo. Aos poucos estou interagindo com a clientela. Observei que há uma maior presença masculina na banca, embora, seja a mulher, é quem mais consome livros. Interessante, observei que Monteiro Lobato destes autores que tratam do universo da criança, continua bem procurado. Sou também ouvinte das histórias que Vavá conta o que sabe sobre Monteiro Lobato.
Voltar a atuar no mercado de livros foi muito bom, além de lidar com livros usados, melhor ainda, serviu de porta para retornar o meu interesse em estudar o mercado de livros, principalmente a partir dos anos 30, as editoras consideradas de "esquerda", de inventariar o comércio de livros deste período, de esbarrar com achados preciosos.
A sugestão de recortar a realidade do universo do livro, de ficar analisando o Rio de Janeiro, partiu de uma conversa com Paulo Adolfo, também editor e um dos filhos de um dos maiores editores de histórias em quadrinhos de nosso país, a Editora Brasil- América - EBAL, fundada em 1945, por seu pai, Adolfo Aizen, considerado por muitos como o "Pai das Histórias em Quadrinhos do Brasil", como pode ser observado na Wilkipédia. É interessante registrar, poucos sabem, que o editor Adolfo Aizen, junto com outro editor Sebastião Hersen, donos da pequena editora Adersen, localizada na rua do Lavradio, 60 foram os editores que publicaram a primeira edição de Menino de Engenho, de autoria de José Lins do Rego.

Voltar ao livro possibilitou entrar em contato com novas pessoas, fazer amigos, conhecer novos e rever antigos livreiros, editores, rever amigos dos bons tempos da Tijuca e da faculdade, professores e colegas. Durante o tempo em que estou na rua, vi muita gente conhecida, os vendedores, quando sabem que estou ali, aparecem. Não imaginava esta receptividade. Respiro por todos os poros, muitas vezes de alegria, por estes encontros. O livro seja ele, antigo ou novo, é uma janela para o mundo. Escrevi este texto como forma de reconhecimento e agradecimento ao livreiro Francisco Olivar pela oportunidade de voltar a trabalhar com livros.
Os netos estão chegando, o mais velho, manifesta um interesse muito grande pelos livros, o mais novo, sem dúvida vai acompanhar.




Tadashi Kaminagai:

quarta-feira, maio 28, 2008

De volta ao livro, estou respirando.














Não resisti ao passar diante de um sebo localizado em uma galeria de Copacabana, entrei. A minha felicidade poderia ter sido maior, no entanto, não foi, pois, estava delimitada aos poucos tostões que trazia no bolso. Ao dar os primeiros passos no interior da loja, esbarrei com os velhos conhecidos de outros carnavais, os habituais freqüentadores de alfarrábios. Com os cumprimentos de praxe, depois, cada um toma um rumo. Há os que ficam por ali, de papo, de olho nos livros e nos clientes que chegam para se desfazerem de livros. De prontidão, são os primeiros a reservarem os livros, ou mesmo, a comprarem. Engraçado há sempre gente querendo se desfazer de livros. No momento em que eu estava na loja no periodo da manhã, apareceu uma senhora, bem vestida por sinal, portando uma sacola com livros, cuja intenção era fazer uma avaliação, pois tinha um amigo que estava muito interessado em comprar os seus livros, mas ela não sabia qual o preço que poderia vender para o amigo. Mostrou os exemplares ao rapaz que avalia e se ele poderia dizer quanto valia. Uma rápida olhada nos títulos o vendedor, estipulou o valor total da mercadoria, que sem dúvida foi bem depreciado, o baixo valor, foi reforçado com o argumento, de que os livros oferecidos, alguns deles, ainda haveriam exemplares em estoque. Ao estipular um valor X, a senhora logo se mostrou decepcionada, mas o livreiro esclareceu que ela poderia negociar o preço com o amigo, provavelmente com o valor mais elevado, colocou tudo na sacola e foi embora.
Muitas vezes é fácil detectar clientes que querem vender livros, mas sentem-se envergonhados, usam vários artifícios ao abordar o comprador; observei por muitas vezes como cliente de sebo, ou como profissional, muita decepção por parte de clientes ao se desfazerem de livros ou bibliotecas, imaginam que o livro de sua propriedade vale muito, porém, não desconfiam que nunca vai corresponder, nem se aproximar do valor imaginado. Há situações em que se pode chegar através de uma conversinha, um pouquinho para lá e para cá, uma negociação, ainda mais se o livreiro percebe com clareza que é material raro e valioso que o cliente tem para oferecer.
Ao trabalhar em um sebo percebi com maior clareza, o procedimento do livreiro ou o encarregado em fazer a avalição, isto, quando os livros implicam em uma visita ao local para fazer o frete da mercadoria; na livraria em que trabalhei o livreiro não dispunha de transporte próprio, trazia de táxi, no contato seja pessoal ou por telefone, o livreiro geralmente procura saber qual a quantidade de livros (uma estimativa) e os assuntos, muitos são os livreiros que não trabalham por exemplo com livros jurídicos, ou de medicina. Geralmente é avaliado pelo valor mais baixo até o limite que o livreiro tem disponível para oferecer. Há muitas livrarias que aceitam troca, geralmente, são 2 ou 3 livros por um, há outra opção, estipula-se um valor X para ser trocado em livros. Por falar em preço de livros em sebos, houve pelo que constatei um considerável aumento para venda dos livros. Geralmente os livros didáticos de 1º e 2º graus são recusados, alguns jurídicos, para livrarias da zona sul, não são receptivos. Hoje com toda certeza, o comércio que oferece maiores condições de trabalho e lucratividade é o segmento de livros usados. Convém registrar que há bons sebos e bons livreiros. O sebo, entendo e não convém esquecer, como uma das vias de formação de um profissional do livro, claro que existem outros pré-requisitos nesta formação. Para se formar um livreiro, leva-se um tempo. O primeiro deles, é gostar de livros e que implica de imediato em gostar de ler. O livro tem de ser tratado com carinho, com cuidado, com zelo, diria mesmo com sabedoria.
Sempre freqüentei sebos, desde do período em que cursava Ciências Sociais nos anos 70, no Largo de São Francisco, depois ou antes da aula, ia em busca dos tesouros de minha área de interesse, encontrava com as maiores preciosidades literárias de diversos quilates. Gostava muito de periódicos, das revistas pertinentes às ciências sociais. No circuito dos sebos localizados no centro sempre estava em companhia de meu querido professor Aluizio Alves Filho, grande Mestre e Doutor em Ciências Politicas, o homem é provedor de múltiplo saber, conhece tudo sobre: Brasil, Ciências Sociais e Politicas, Monteiro Lobato e Oliveira Viana; um intelectual e escritor com vários livros editados, além de enorme bagagem. Aluizio é um tremendo bibiliófilo, sua biblioteca, é um multiplo acervo sobre o nosso país com uma ligeira tintura para a concentração em Política; quem chegou a conhecer como eu, garante que é um dos melhores acervos em nossa área, na ocasião era despontada como fantástica. Quando não saíamos juntos da faculdade, nos encontrávamos em algum sebo, ou éramos avisados que um ou outro havia passado por ali. O mestre tem um bom faro para preciosidades e raridades, aprendi muito com Aluizio, não é à toa que é um mestre.
O ultimo sebo que visitei na cidade, quando trabalhei com meu sogro, até o ano de 2002, foi a Livraria Brasileira, fundada em 1972, pelo livreiro Oscar Muller, localizada no Edifício Central. Considerado um dos mais tradicionais sebos do Rio de Janeiro, algum tempo depois, li pela imprensa que foi despejado.Foram para outro local. Lembro que comprei o livro O Pais da Bola, editado em 98, pela Record, de autoria de Betty Milan. Nesta ocasião estava catando livros sobre futebol, amadurecia a idéia em fazer algo acadêmico nesta área, haviam dois colegas sociólogos que estavam envolvidos com a especialização sobre futebol, levando adiante o Núcleo de Sociologia do Futebol na UERJ, um era Mauricio Murad, vascaíno e o outro o flamenguista Ronaldo Helal. Cheguei a comprar um dos exemplares da revista Pesquisa de Campo, editada pelo núcleo. Tempos depois, acabei por descartar este projeto, nele estava incluido um estudo sobre o Vasco, sobre a identidade portuguesa, um clube da colonia portuguesa, etc, etc ...
Na livraria de Copacabana ainda percorri algumas seções, olhei algumas prateleiras de literatura brasileira, me interessei pelos livros de Lia Luft e um de Heloísa Seixas, pensei em deixar reservado, desisti e passei para as Ciências Sociais, que atualmente voltei a ter interesse encontrei o livro que me interessava muito. O sebo tem disto, de repente, encontra um livro que se procura, o pior já tive o livro, fui divulgador da editora nos anos 70/80 e fui seu pracista através da Vários Escritos; incrível foi o primeiro livro que encontrei na seção, assim, como se estivesse caído do céu. Comecei a reler e está sendo proveitoso para uma idéia que acalento de uns dois anos prá cá, que é a historia do mercado editorial, o escritor foi dono de uma editora nos anos 60 onde publicou a maioria de seus livros e que foi fechada pela ditadura; publicou sob pseudônimo seu livro em uma editora de esquerda nos anos 30 e que foi fechada, foi o responsável pela fundação, organização e um dos editores, de uma editora de esquerda que foi fechada também pela ditadura militar de 64.
Uma boa notícia, recebi pela manhã, um convite de um amigo para trabalhar na rua com livros usados, aceitei de imediato, para mim, foi um remédio para o corpo e o espírito, começo amanhã, com o pé direito e a enorme vontade de voltar atuar no comércio de livros. "Alea jacta est"







Aécio de Andrade - Artista Naïf, autodidata, nasceu em São Paulo. Para mais detalhes consultar o site Art Canal

quarta-feira, abril 09, 2008

Recordações de um livreiro

Estava ontem pensando em livros, ou melhor, estava recordando os momentos em que fui um profissional do livro. Em que saia quando não estava em trabalho interno, fazendo chuva ou sol pra rua vender livros, apresentar as novidades das editoras. Acho que nem sempre deve-se apresentar apenas os lançamentos, deve-se de alguma forma (re)apresentar o catálogo da editora usando uma capa ou mesmo livro, resgatar aquele livro que ficou esquecido, deixado de lado pelo livreiro. É uma maneira de dar uma oxigenada no livro, um pouco de sobrevida, fazer com que ele apareça, que ele respire nas estantes ou balcões das livrarias.
Fazia visita em vários bairros da cidade do Rio de Janeiro e não são muitos os bairros em que havia a presença de livrarias. Algumas livrarias a visita se tornava mais frequente em função do ritmo de compra de cada uma; muita gente, autor, principalmente, pensa que um livro não se encontra em determinada livraria, é o fim do mundo. Não sabe, desconhece a conduta daquela livraria, pode haver diversos motivos de um livro não estar´presente em uma livraria. A ausência de um livro em uma livraria badalada ou não, também serve para os editores, que não compreendem como o livro que editam, não está nesta ou naquela livraria. Há títulos que não impulsionam nenhuma empatia, não geram vendas. Quando há resistências por parte do livreiro por alguma razão podemos entrar com consignação, aqui abro um parentêses, há livreiros e editores que não apreciam consignações..
Os editores para se preservarem engendram limites e mais limites para compra de livros por parte da livraria, estabelecem desde mínimo de faturamento, até a negativação por parte do comerciante na praça. Em minha época de distribuidor achava um absurdo pautar minhas vendas através de uma entidade de classes que estava voltada para o livro didático. Se houvesse algum débito pendente em alguma editora ou distribuidora de livros didáticos, haveria restrição de crédito e não forneceria para o cliente. Não partilhava desta concepção, são fornecedores diferentes, nem queria saber, fornecia sem me ater ao impedimento por parte deste controle em que as editoras didáticas determinavam. Era a conduta deles e não a minha. Fornecia, seja através de um vale provisório, de um livro, até se obter condições de faturamento, nunca criei obstáculos para vender. Achava melhor o livro na livraria do que no depósito. Não fazia como os didáticos que desprezavam as livrarias para venderem nas escolas. Subvertia prazo e descontos, não segmentava por faturamento e tamanho, todos independentes da livraria, receberiam o mesmo tratamento. Havia no Rio de Janeiro, de minha época casos excepcionais, como a Sodiler, por ser a maior rede de livrarias da cidade. Era um caso pontual, pois não compravam toda novidade, inclusive pelas características das lojas em aeroportos, rodoviárias e shoppings. Abria espaços para conversas para negociar prazo em função de alguma promoção das editoras que eu representava, em que alteravam o meu desconto e o meu prazo, assim poderia repassar condições melhores ao livreiro.
Como fui comprador nas livrarias e pracista em editoras e na minha distribuidora, fui testemunha de que era raro encontrar um vendedor de livros didáticos. Nesta caminhada esbarrava com muitos vendedores pracistas e não identificava um profissional da área de didáticos. Estas editoras faziam um bom trabalho de divulgação, aí sim era o caminho da mina. Naturalmente pegava outros atalhos. A distribuidora Obra Aberta tinha um perfil de atuação com livros na área universitária, um segmento que priorizei desde da época em que criei em Ipanema nos anos 80, a livraria Quarup.
Muitos livros demoram na reposição, também há muitos fatores para ausência de um título, que vai do desinteresse por parte do livreiro em repor, nas interferências das editoras que exigem mínimo de faturamento que relutam em fornecer, na conduta de compra por parte das livrarias. Entendendo que há o momento ideal de se fazer um pedido para editoras ou distribuidoras, considerando por exemplo, as datas de montar um pedido. Ao coletar meus pedidos, tinha oportunidade de flagrar listas de pedidos pendentes na compra do livreiro por não poder comprar, se não houve liberação por parte de quem detém esta ordem, nada é feito. Neste aspecto eu facilitava, fornecia para os livreiros em forma de vale e assim que estivesse liberado o pedido, o procedimento de compra seria formalizado.
Trabalhar com livro não é fácil, entendo não ser um privilégio, mas um profissional do livro deve estar preparado, ter uma boa bagagem cultural, de saber fazer uma leitura do cliente, seja ele pessoa física ou jurídica, neste último, em se tratando de um pracista. Em uma livraria saber o momento da abordagem e não ficar muito na cola, inibindo seus movimentos, há de se dar espaços para consultar prateleiras e balcões, ser gentil. Não se deve perder de vista o cliente, para isto, o acompanhe com os olhos, de alguma forma ele vai lhe sinalizar, quando abrir esta brecha, é o momento de sua intervenção.
O livreiro tem de estar por dentro do movimento editorial, ficar antenado, conhecer os gostos e manias, as leituras de seus clientes. Não adianta oferecer um livro que nada tem haver com o que cliente , a recusa vai ser de imediato. O livro é uma mercadoria especial, se ele procura por Paulo Freire, por Pedagogia do Oprimido, e o livro não estiver em estoque, não adianta o livreiro oferecer gato por lebre, ou até mostrar para ver se cola o livro de Marcus Freire, é difícil, mas não elimino a possibilidade do leitor comprar o livro apresentado. Se o leitor for receptivo, acho válido, mas não no sentido de empurrar um livro no lugar do outro.
De preferência não deve perder de vista o suporte dos cadernos literários, ou das editoras, mesmo que tais cadernos "culturais" sejam viciados e deformem por interesses a produção editorial de editoras que passam ao largo destes jornais. Nunca vão ser mencionadas ou resenhadas, mesmo que lotem as mesas com livros de cortesia para os jornalistas que "resenham". Os livros podem parar em sebos. Estes espaços da imprensa, são ocupados como territórios de algumas editoras. Não posso deixar de apontar que muitos leitores/clientes tomam estes cadernos como norte de suas compras e consultas. Importante que o livreiro, seja também um leitor, um atento leitor e que repasse as informações para o cliente.

O mercado livreiro está como sempre com dificuldades, de várias ordens, uma livraria não pode comprar tudo que aparece, há mais editoras do que livrarias. O livreiro fica doido e nem dispõe de tanta verba para comprar, vai sobrar para alguém, de preferência para editoras que não sejam badaladas na mídia. Ainda se lida com autor com produção própria que quer com toda razão ocupar o seu espaço, mal sabe que há livreiros que não dão nenhuma importância a este tipo de livro.
O que me incomodava enquanto livreiro era ter de lidar com livros sem lombada, muito fino, de poucas páginas, este tipo de formato a tendência era ficar sumido nas prateleiras. Um livro com boa apresentação visual, bom título e autor, independente dele ser bom ou não, o importante para mim, era o registro fotográfico em minha memória, que estes elementos, ingredientes que ajudavam a formar um contato inicial com o livro. Um outra via de registro do livro, é o assunto, ou tema, claro que exige do profissional, uma intimidade maior com o que circula na livraria, como está disposta as estantes e os assuntos. O livro mesmo passa esta informação.
Um dos meus últimos atendimentos em um sebo que trabalhei tentando dar uma organização nos assuntos, pois fui chamado nesta condição de dar um jeito na bagunça, mas como vício do livreiro, acabou ficando tudo como estava, em desordem total. O livreiro por uma razão que ainda hoje pensando sobre o assunto, não consigo entender, se negava a permitir que se colocasse em ordem alfabética os livros na estante. Como havia reclamações dos clientes sobre o entendimento, a concepção de livraria do livreiro, enfim, era dele, amarra- se o burro conforme a vontade do dono. Como não foi capaz de utilizar do bom senso, acabava deste modo inibindo qualquer possibilidade de arrumação. Independente do bom acervo que a loja possuía, demonstrei e foi nesta condição de livreiro que fui chamado. Acho que reúno as condições de livreiro, sou livreiro, pode ser que algum dos que estão no mercado discordem, também, nunca soube, não chegou até a mim, tal classificação em contrário. Dando um exemplo de que ocorreu, ao atender uma cliente negra sobre assuntos de escravidão, sobre negritude, ela professora e historiadora com atuação no interior do estado.
Conversávamos, me apresentei como antigo livreiro e sociólogo, em um dado momento, me perguntou se havia algum livro sobre TEN, como havia arrumado na desordem as prateleiras, disse que havia um livro, que falava sobre o Teatro Experimental do Negro, através de depoimento das atrizes que protagonizaram o movimento negro em nosso país, indiquei o livro da jornalista Sandra Almada, Damas Negras, editado pela Mauad, ficou contente com a indicação, acabou por levar o livro. Há donos de livrarias que se sentem incomodados quando um "vendedor" mantém uma conversa com o cliente, acham mesmo que a sua presença serve apenas para pegar o livro e entregar para o cliente. Para isso a informação que dispunha me valeu bastante, consegui vender um livro e passei credibilidade na indicação do livro, com certeza é um dos critérios que os livreiros devem ter em sua formação como profissional.










Raimundo Brandão Cela -
Nasceu em Sobral e faleceu em Niterói, 1890 - 1954 "Fitando o Mar"

sábado, março 22, 2008

Um Vendedor de Livros.


















Remexendo com os velhos papéis amarelados das páginas avulsas de minhas memórias deixadas num canto das gavetas desarrumadas, é verdade, algumas delas, até com poeira, estão. Nada que uma soprada ou um pano, não dê jeito. Aliás, estes registros são mantidos deste jeito, pois é assim, que consigo dar uma ordem neles. De uns tempos prá cá, criei o blog Esquinas do Tempo, um espaço reservado para outros escritos, pelo menos imagino que sejam identificados como contos, ou crônicas quando abordo assuntos pertinentes ao meu clube do coração, o Vasco da Gama.

Manter este blog imagino que seja um dos mecanismos que engendro para resgatar através dos fragmentos colados em minhas lembranças, um modo de me encontrar com o tempo, de voltar para trás, com um recurso de um retrovisor, olhar para um passado que transformo em presente. Gosto de me ter como leitor e espectador diante desta tela. Quando mergulho em busca de fragmentos, mesmo que em superfície, ou nadando no raso, procuro ser um sujeito bem intencionado, com o firme propósito de recuperar narrativas, cujo cenário ajudei a meu modo, a fazer. Sou um carpinteiro deste momento, vou traçando e rabiscando trajetos e pontes imaginárias para ligações com o meu tempo de vendedor de livros. Um simples vendedor de livros cuja história não provoca nenhum interesse e se for manifestado algum, provavelmente a sugestão seria à lata de lixo da história. Ir direto, sem pestanejar para o esquecimento, ou em sua tradução moderna, ser deletado.
O vendedor de livros, se não configurar como livreiro ou editor, a tendência é ser rotulado de pouca importância, um sujeito pelo lugar que ocupa no elo da comercialização. Editores e Distribuidores não reconhecem por várias razões a importância de um vendedor de livros, neste caso, de um "pracista", um vendedor externo, um profissional do livro, que representa editoras ou distribuidoras com atuação nas praças das cidades, para os vários tipos de comércio. Por outro lado, há editores ou distribuidores que mantém vendedores por muitos anos, atuando por muito tempo na mesma empresa. Fiquei por quase cinco anos na Paz e Terra, saí para caminhar com as próprias pernas, resolvi montar uma distribuidora, a Obra Aberta, localizada na Cinelândia, na Rua Álvaro Alvim, 48, em cima do cinema Pathé, fechado nos anos 90, transformou-se em um templo religioso. Outra editora que fiquei por algum tempo, foi a Edições Achiamé, também tive várias passagens, como divulgador, pracista e distribuidor.
A começar pela mídia carioca, durante este tempo de militância como vendedor, nunca consegui localizar ou identificar alguma reportagem com vendedores, seja interno ou externo. são sempre os mesmos livreiros e editores. Distribuidor também muito pouco, quando muito, os poucos legitimados pela mídia, que exercem o dublê de editor/distribuidor. Às vezes é necessário dar uma pausa para um cafezinho, sair do assunto, não totalmente, pois quero falar sobre vendedores, vendedores de livros, seja de ilusão ou de transformação.
No Rio de Janeiro, diferente do que os jornalistas classificavam como livrarias, geralmente vinculavam aos badalados livreiros e editores, tratados para o público leitor com se existissem apenas estes. Pequenas ou grandes eram depreciadas, ignoradas pelos jovens jornalistas.

Confesso que com esta declaração de partilhar meus escritos com outro espaço como Esquinas, além de breves comentários em blogs sobre futebol, acabo por deixar ao relento o blog Quitanda, este espaço que reservei para narrar de algum modo minha trajetória no mercado de livros. Claro que não incide a culpabilidade do tempo em que fico dedicado ao Esquinas, tem também o que me traz grande felicidade, a maior delas, que é a presença de meus dois netos. Ramom, o mais velho, demonstra, é visível, ser um garoto criativo, inteligente, esperto até demais. Mudou de escola, até que enfim, faz natação e bagunças de toda natureza. O mais novo, quer dizer, Ricardo, é mais centrado, obedece mais, comportamento que até o momento posso dizer como diametralmente oposto ao irmão. Se assemelham em alguns momentos na bagunça, características de crianças sadias.Claro que em Ricardo observa-se traços de uma criança inteligente, mas por outro lado, há uma predisposição para chorar, fica sensibilizado com a negativa, contrariado, cai em prantos. Grita de alegria e de raiva. Enfim, unidos, bagunçam com o coretos dos avós. Dos pais não quero nem falar, pois, a convivência diária com a bagunça, são as verdadeiras testemunhas. Mas isto tudo, é vida. Faz parte da dinâmica do aprendizado.
Como o propósito deste texto é narrar minha passagem no mundo dos livros, tive que me manter sob uma camisa de força para não fugir do que pretendo. Falar de meus netos, obrigatoriamente me conduz a extensas narrativas, a um blá blá interminável. Coisas de avô que gosta de rascunhar, mesmo que tenha como fio condutor a convivência com os netos. Assim vou costurando um texto que apresento aqui ou em Esquinas do Tempo, faço mesmo de modo esparso. Vou prosseguindo e produzindo meus textos enfaixados sob o campo da memória, diria mesmo, singulares, pois estão no âmbito de minhas reminiscências, todos produzidos com vínculos em minha vivência, como foi o texto ficcional que publiquei com o título de "Lino e seu avô - Uma amizade sem fim." Aproveitei a idéia de rato de biblioteca e rato de livraria para construir um história de um Ratinho e suas relações de amizade com o avô. Bem como o texto está cada vez maior e cansando os meus dois leitores, acho melhor e prefiro mesmo deixar para uma próxima oportunidade e voltar a escrever ou falar sobre vendedores de livros. Até breve.

* Berenice Barreto Fernandes - Conhecida como Beré ou Berenic. Arte Naïf - Para maiores detalhes consultar o excelente site Artcanal

















segunda-feira, março 10, 2008

Editoras e Livrarias - Um Papo.

















Atualmente nem nos sebos tenho passado para xeretar algo de interessante para ler. O jornal impresso também desisti de ler, apenas pego emprestado com a vizinha o caderno de classificados para localizar alguma oportunidade de trabalho, aliás, estão cada vez mais escassas, mais ainda, quando a idade é superior aos cinqüenta anos.

Fico em casa como se estivesse internado, diante do computador, fico horas pesquisando, mergulhado na leitura da produção intelectual das ciências sociais. Voltei após longos invernos a ficar interessado em minha área de formação acadêmica, que abandonei para me dedicar ao mundo dos livros. Claro que pela atividade que exercia com os livros, obtinha informações do que as ciências sociais estava produzindo. Fui distribuidor e editor na cidade do Rio de Janeiro e o perfil da empresa, era alinhado com as editoras universistárias.
Algumas destas editoras em seus catálogos havia algum conhecido do meu tempo de estudante, ou de quando atuei como profissional de divulgação editorial nas universidades. Lembro que fui divulgador de editoras com uma tintura de esquerda nos anos 80, trabalhava com distribuidores ou diretamente com os editores. Haviam editoras que eu não considerava como de esquerda, por exemplo: Ibrasa/Ibrex, Papelivros, Documentário e outras que agora não lembro. Eram representadas pela Vários Escritos, um distribuidor que representava também: Alfa-Ômega, Summus/Ágora, Avenir, Vega. Divulguei pela Quadrelli, as editoras Brasiliense, Global e Alhambra. Fui divulgador das editoras Paz e Terra e Edições Graal. Bons tempos eram aqueles, em que eu tinha bastante editora para divulgar como a Hucitec e Livramento, representadas pela Século XXI, e finalmente as Edições Achiamé.
Foi um trabalho de suma importância para as editoras, um momento de interação entre editor e autor/professor que passou de alguma forma atuar como um agente de vendas, ao indicar títulos para adoção. Para a Brasiliense neste período foi uma mão na roda, estavam arejando a o catálogo e lançando diversas coleções, como os Primeiros Passos. Uma época de efervescência cultural, títulos e mais títulos eram lançados.
A Brasiliense surgiu no inicio dos anos 40 com vários sócios, dentre eles: Caio Prado Júnior, o pai de Caio, Lenadro Dupré, Hermes Lima e Arthur Heládio Neves. Monteiro Lobato foi um dos seus sócios.A editora Brasiliense detinha os direitos da obra de Monteiro Lobato desde 1945. O autor, amigo de Caio de longa data assinou antes de morrer um contrato de validade "ad infinitum", até cair em dominio público, o que não aconteceu. Outro dia li pela internet que houve uma disputa judicial com os herdeiros de Lobato e a Brasiliense , que acabou perdendo os direitos, quem saiu beneficiada foi a Editora Globo que passa a publicar todos os títulos de Monteiro, com nova apresentação visual da obra do grande autor da literatura infantil.
Caio Prado passou o bastão para o seu filho Caio Graco Prado nos anos 70. A editora passou por um período em que esbarrava com o cerceamento dos militares e os segmentos conservadores, tanto que em 1964 fecharam a Revista Brasiliense editada desde 1955 e dirigida por Elias Chaves Neto. Quem examinasse o catálogo da editora poderia identificar uma produção de esquerda. Luiz Schwarcz atuou na editora, passando por estagiário até ser diretor editorial, cuja saída em 1986, montou a sua própria editora, a Companhia das Letras. Caio Graco fundou em 1978 com Claudio Abramo o jornal Leia Livros, deixou de funcionar nos anos 90. Hoje a editora está sob os cuidados da filha Yolanda Prado, a Danda, que assumiu a editora após a morte do irmão Caio Graco em 1992 em acidente de moto.
O mercado de livros mudou bastante, determinados espaços de exposição livros que assumem posição de destaque nos espaços de uma livraria, ou melhor, nas grandes livrarias, são comprados para que ocupem determinados lugares estratégicos, logo com maior visibilidade para o cliente. O preço varia entre um pedaço de vitrine, ou pilha de livros, tudo estabelecido pelos livreiros das grandes redes. Lembrei que nos anos 90 fui à Livraria da Vila, havia se mudado há pouco tempo para um novo local. Os donos eram um casal, lembro que o livreiro, de nome Aldo, fui apresentado por Marcus Gasparian. Nesta época estava em São Paulo.pela Paz e Terra, quando fui informado de havia um espaço na parede da loja, uma enorme loja, em que os espaços ocupados por propagandas das editoras, eram pagos.
A noticia que rolou na semana passada é que a Saraiva adquiriu a totalidade das ações da rede de livrarias Siciliano, criada em 1928 e a maior do país; mais os quatro selos editoriais: Arx, Futura, Caramelo, ArxJovem. Depois de longa negociação chegaram aos finalmentes. A Siciliano estava em crise financeira e familiar, envolvida em uma disputa judicial entre o senhor Oswaldo Siciliano e a filha mais velha. Volto a conversar sobre livros em próxima oportunidade.


* Adélio Sarro - Pintor, Escultor e Muralista















quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Uma Conversa sobre Editoras

















Nestas buscas que tenho feito pelas páginas da internet, fiquei espantado com a identificação de um leitor que nos anos 70 comprou a “Historia da Revolução Russa” em 3 volumes de autoria de Leon Trotsky, publicada em 1967 pela Saga, como uma editora de orientação comunista. Não tenho tanta certeza quanto este leitor de rotular a Saga com esta assinatura. Incluiria esta classificação como uma editora com perfil de esquerda. A Saga foi dirigida por José Aparecido de Oliveira (1929/2007) ex-embaixador, ministro da Cultura do governo Sarney, depois adquirida pelo empresário e editor Fernando Gasparian, (1930/2006) um liberal à americana como define Marcus Gasparian, um dos seus filhos. A Historia da Revolução Russa em 3 vols. foi editado pela Paz e Terra, na coleção Pensamento Crítico vol.11, relançada em 1977. Dez anos após a edição publicada pela Saga que deixou de existir no inicio dos anos 70. Recentemente o livro foi reeditado com nova apresentação visual e com nova tradução pela Editora Sunderman surgida entre nós em 2003. A editora é uma homenagem ao casal de militantes socialistas José Luis e Rosa Sunderman dirigentes do PSTU assassinados em 1994. A edição saiu em dois tomos. A editora mantém vínculos com o PSTU – Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados.

No panorama do surgimento de editoras houve sim, editoras que se identificavam como de esquerda e outras como católicas ou conservadoras, ou liberais e direitistas. Nos anos 60 houve editoras que foram simpáticas e colaboraram de alguma forma para o golpe de 64 através do Ipês – Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, fundado em 1961. Há um excelente livro 1964: A Conquista do Estado: Ação Política, poder e golpe de classe, do cientista político uruguaio e ex- professor da UFF, René Aramand Dreifuss (1945/2003), editado pela Vozes (católica) que analisa o papel do empresariado brasileiro no processo de desencadeamento do golpe de 64. Os editores como empresários não poderiam estar de fora, deram a sua contribuição. Durante o período editorial surgiram editoras de oposição ao regime militar.

Havia pequenas editoras de esquerda com ligações partidárias ou grupos políticos. Com uma tintura de esquerda, mas não comunista, por exemplo: a Editora Sabiá criada em 1967 por Fernando Sabino em parceria com Rubem Braga. Editou Ernesto Che Guevara, o livro Nossa Luta em Sierra Maestra, publicado em 1968; O Cristo do Povo de Márcio Moreira Alves editado em 1968 ou Dom Helder Câmara em A Revolução dentro da Paz editado em 1968.

Identificar uma editora como de orientação comunista como fez o leitor é de uma simplicidade, deste jeito a sua referência está contaminada por sua posição ideológica. O leitor não tem idéia do catálogo da editora Saga que publicou dentre outros autores: Celso Furtado, Jorge Wilheim, Luciano Martins, Paulo Mercadante, Thomas Skidmore, Guerreiro Ramos, Guevara; seria o mesmo que classificar como comunista o editor José Olympio por ter em seu catálogo escritores comunistas, ou editor da Record, Alfredo Machado também por ter editado escritores comunistas. Ou de que Carlos Lacerda que nos anos 30 teve uma aproximação com a Federação da Juventude Comunista, a Nova Fronteira, sua editora criada em 1965, seria comunista. Ou mais recentemente a Record por ter incorporado uma editora com vínculos de esquerda como a Editora Civilização Brasileira que teve em seu antigo proprietário Ênio Silveira como dirigente do PCB, não são seguramente indicadores para identificar uma editora com orientação comunista como sugere o leitor. Claro que pelo catálogo pode-se observar que determinado editor produz, deste modo, pode-se identificar em que campo ideológico ele transita. O catálogo da Civilização era bem plural se examinarmos melhor, ali encontramos desde Adonias Filho, Machado de Assis, Luckacs, Nelson Werneck Sodré, Cony, Moacyr Félix, Dom Helder, Vianna Moog, Otávio Malta, Stanislaw Ponte Preta, Octávio Ianni e muitos outros. Destes editores o que foi mais perseguido pela ditadura, foi sem dúvida nenhuma o editor Ênio Silveira.

Fico por aqui e espero que em nova oportunidade possa voltar ao assunto.




Mário Zanini
: Nasceu na cidade de São Paulo, em 10 de setembro de 1907 e faleceu na mesma cidade em 16 de agosto de 1971.
Filho de imigrantes italianos. Participou do Grupo Santa Helena e da Familia Artística Paulista. Fonte de consulta: FAAP