terça-feira, dezembro 04, 2007

Uma Despedida para Helenoida Studart














Quando li a noticia da morte de Heloneida Studart bateu de imediato, fragmentos de lembranças dos anos 70 e 80. Heloneida foi escritora, teatróloga, ensaísta e jornalista, nascida em Fortaleza, em 9 de Abril de 1932, e faleceu em 3 Dezembro de 2007, vitima de parada cardíaca, na Casa de Saúde São José, aos 75 anos. Esta combativa mulher, que passou por prisões na época da ditadura militar que se instalou em nosso país; foi moradora do Leme e mãe de seis filhos, todos do sexo masculino.

Lembrei de imediato que fui seu eleitor e leitor. Aqui neste mesmo espaço da Quitanda escrevi sobre Heloneida e mencionei um dos seus trabalhos, “Homem não entra” como teatróloga, peça em que Cidinha Campos atuou como atriz. Escrevi o post em junho de 2005, intitulado: “A Militante Heloneida Studart“. Admirava a trajetória e os trabalhos de Heloneida, em sua atuação como mulher e cidadã.

Sua trajetória passa pelo engajamento ao movimento de luta pelos direitos da mulher brasileira, junto com Rose Muraro, que foi uma das suas amigas, criaram o Centro Brasileiro da Mulher, mais as sociólogas Moema Toscano, Fanny Tabak, Branca Moreira Alves, todas com livros publicados. Neste período dos anos 70, aumentei minha carga em leituras, estava tão atuante que fui associado ao CERU - Centro de Estudos Rurais e Urbanos da USP, da Revista Ciência e Cultura (SBPC), as publicações da Fundação Carlos Chagas, de São Paulo; leitor de vários jornais alternativos, também com a temática sobre as mulheres, como Brasil Mulher e Nós Mulheres. Tinha um grande interesse por estudos feministas, lia na ocasião os poucos livros publicados, recordo que o movimento editorial engatinhava com esta produção, aqui vejo o papel de suma importância de Rose Marie Muraro como editora por muito tempo da Editora Vozes e de outras casas publicadoras.

Eu procurava o livro Segundo Sexo, editado pela Difel em dois volumes, de autoria de Simone de Beauvoir, andava esgotado, como precisava ler e não encontrava, quem acabou me emprestando foi a escritora e novelista Glória Perez, fomos colegas da mesma faculdade, ela no curso de História, eu no curso de Ciências Sociais. Na ocasião fazia um trabalho para o curso de Antropologia, ministrado por Venúsia Neiva. Escolhi como objeto de investigação a prostituta, ou “mulheres da vida” como muitos chamavam as “trabalhadoras” do Mangue, um espaço denominado de baixo meretrício, localizado no centro do Rio de Janeiro. Estava empolgado e eu como homem fui senão o único, um dos poucos a se interessar pelo trabalho feminino. Tentei perceber o corpo como uma forma de expressão do trabalho informal, fui a campo, pesquisar e entrevistar algumas prostitutas, acompanhado por um grupo de colegas da faculdade.

Deste interesse parti para leitura de autoras como Eva Alterman Blay, um livro editado pela Ática, intitulado Trabalho Domesticado, em artigos, de Heleieth Safiotti , a sua tese publicada em livro, A Mulher na Sociedade de Classes: Mito e Realidade, editado pela editora paulista Quatro Artes e os vários artigos espalhados pelos periódicos; lia Carmem da Silva (1919/1985), inclusive os artigos publicados na Revista Cláudia, filava a revista de minha madrinha.

Como profissional do livro, atuando em livraria no final dos anos 70, lidei com a produção de Heloneida, fui testemunha de um livrinho chamado “Mulher - Objeto de Cama e Mesa”, obra que alcançou milhares de exemplares vendidos e foi publicado pela Editora Vozes, na coleção “Cosmovisão”, com introdução de Lauro de Oliveira Lima, educador cearense e autor de um título da mesma coleção.

Em 78 cravei meu voto em Heloneida como deputada estadual pelo antigo MDB, depois votei mais tarde quando passou para o PT, recordo que havia um escritório de sua campanha como deputada na Avenida Copacabana, próximo da Rua Prado Júnior, estampado com a cor rosa que a identificava. Tive como colega um dos assessores de Heloneida nos anos 70.

No momento tenho dois livros de Heloneida, um é O Pardal é um Pássaro Azul, um romance editado pela Civilização Brasileira e o outro é o que está em exposição na Galeria da Quitanda. O Estandarte da Agonia, um romance editado em 1981, publicado pela Editora Nova Fronteira, com capa de Victor Burton. O livro é inspirado em Zuzu Angel e faz parte de uma trilogia que a própria autora definiu como da tortura, que compreende os títulos: O Pardal é um Pássaro Azul e O Torturador em Romaria, editado pela Rocco, nos anos 90. Acho que Heloneida nesta ausência foi conversar com Deus e vai ser uma conversa sem fim...