quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Uma Conversa sobre Editoras

















Nestas buscas que tenho feito pelas páginas da internet, fiquei espantado com a identificação de um leitor que nos anos 70 comprou a “Historia da Revolução Russa” em 3 volumes de autoria de Leon Trotsky, publicada em 1967 pela Saga, como uma editora de orientação comunista. Não tenho tanta certeza quanto este leitor de rotular a Saga com esta assinatura. Incluiria esta classificação como uma editora com perfil de esquerda. A Saga foi dirigida por José Aparecido de Oliveira (1929/2007) ex-embaixador, ministro da Cultura do governo Sarney, depois adquirida pelo empresário e editor Fernando Gasparian, (1930/2006) um liberal à americana como define Marcus Gasparian, um dos seus filhos. A Historia da Revolução Russa em 3 vols. foi editado pela Paz e Terra, na coleção Pensamento Crítico vol.11, relançada em 1977. Dez anos após a edição publicada pela Saga que deixou de existir no inicio dos anos 70. Recentemente o livro foi reeditado com nova apresentação visual e com nova tradução pela Editora Sunderman surgida entre nós em 2003. A editora é uma homenagem ao casal de militantes socialistas José Luis e Rosa Sunderman dirigentes do PSTU assassinados em 1994. A edição saiu em dois tomos. A editora mantém vínculos com o PSTU – Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados.

No panorama do surgimento de editoras houve sim, editoras que se identificavam como de esquerda e outras como católicas ou conservadoras, ou liberais e direitistas. Nos anos 60 houve editoras que foram simpáticas e colaboraram de alguma forma para o golpe de 64 através do Ipês – Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, fundado em 1961. Há um excelente livro 1964: A Conquista do Estado: Ação Política, poder e golpe de classe, do cientista político uruguaio e ex- professor da UFF, René Aramand Dreifuss (1945/2003), editado pela Vozes (católica) que analisa o papel do empresariado brasileiro no processo de desencadeamento do golpe de 64. Os editores como empresários não poderiam estar de fora, deram a sua contribuição. Durante o período editorial surgiram editoras de oposição ao regime militar.

Havia pequenas editoras de esquerda com ligações partidárias ou grupos políticos. Com uma tintura de esquerda, mas não comunista, por exemplo: a Editora Sabiá criada em 1967 por Fernando Sabino em parceria com Rubem Braga. Editou Ernesto Che Guevara, o livro Nossa Luta em Sierra Maestra, publicado em 1968; O Cristo do Povo de Márcio Moreira Alves editado em 1968 ou Dom Helder Câmara em A Revolução dentro da Paz editado em 1968.

Identificar uma editora como de orientação comunista como fez o leitor é de uma simplicidade, deste jeito a sua referência está contaminada por sua posição ideológica. O leitor não tem idéia do catálogo da editora Saga que publicou dentre outros autores: Celso Furtado, Jorge Wilheim, Luciano Martins, Paulo Mercadante, Thomas Skidmore, Guerreiro Ramos, Guevara; seria o mesmo que classificar como comunista o editor José Olympio por ter em seu catálogo escritores comunistas, ou editor da Record, Alfredo Machado também por ter editado escritores comunistas. Ou de que Carlos Lacerda que nos anos 30 teve uma aproximação com a Federação da Juventude Comunista, a Nova Fronteira, sua editora criada em 1965, seria comunista. Ou mais recentemente a Record por ter incorporado uma editora com vínculos de esquerda como a Editora Civilização Brasileira que teve em seu antigo proprietário Ênio Silveira como dirigente do PCB, não são seguramente indicadores para identificar uma editora com orientação comunista como sugere o leitor. Claro que pelo catálogo pode-se observar que determinado editor produz, deste modo, pode-se identificar em que campo ideológico ele transita. O catálogo da Civilização era bem plural se examinarmos melhor, ali encontramos desde Adonias Filho, Machado de Assis, Luckacs, Nelson Werneck Sodré, Cony, Moacyr Félix, Dom Helder, Vianna Moog, Otávio Malta, Stanislaw Ponte Preta, Octávio Ianni e muitos outros. Destes editores o que foi mais perseguido pela ditadura, foi sem dúvida nenhuma o editor Ênio Silveira.

Fico por aqui e espero que em nova oportunidade possa voltar ao assunto.




Mário Zanini
: Nasceu na cidade de São Paulo, em 10 de setembro de 1907 e faleceu na mesma cidade em 16 de agosto de 1971.
Filho de imigrantes italianos. Participou do Grupo Santa Helena e da Familia Artística Paulista. Fonte de consulta: FAAP