quarta-feira, maio 28, 2008

De volta ao livro, estou respirando.














Não resisti ao passar diante de um sebo localizado em uma galeria de Copacabana, entrei. A minha felicidade poderia ter sido maior, no entanto, não foi, pois, estava delimitada aos poucos tostões que trazia no bolso. Ao dar os primeiros passos no interior da loja, esbarrei com os velhos conhecidos de outros carnavais, os habituais freqüentadores de alfarrábios. Com os cumprimentos de praxe, depois, cada um toma um rumo. Há os que ficam por ali, de papo, de olho nos livros e nos clientes que chegam para se desfazerem de livros. De prontidão, são os primeiros a reservarem os livros, ou mesmo, a comprarem. Engraçado há sempre gente querendo se desfazer de livros. No momento em que eu estava na loja no periodo da manhã, apareceu uma senhora, bem vestida por sinal, portando uma sacola com livros, cuja intenção era fazer uma avaliação, pois tinha um amigo que estava muito interessado em comprar os seus livros, mas ela não sabia qual o preço que poderia vender para o amigo. Mostrou os exemplares ao rapaz que avalia e se ele poderia dizer quanto valia. Uma rápida olhada nos títulos o vendedor, estipulou o valor total da mercadoria, que sem dúvida foi bem depreciado, o baixo valor, foi reforçado com o argumento, de que os livros oferecidos, alguns deles, ainda haveriam exemplares em estoque. Ao estipular um valor X, a senhora logo se mostrou decepcionada, mas o livreiro esclareceu que ela poderia negociar o preço com o amigo, provavelmente com o valor mais elevado, colocou tudo na sacola e foi embora.
Muitas vezes é fácil detectar clientes que querem vender livros, mas sentem-se envergonhados, usam vários artifícios ao abordar o comprador; observei por muitas vezes como cliente de sebo, ou como profissional, muita decepção por parte de clientes ao se desfazerem de livros ou bibliotecas, imaginam que o livro de sua propriedade vale muito, porém, não desconfiam que nunca vai corresponder, nem se aproximar do valor imaginado. Há situações em que se pode chegar através de uma conversinha, um pouquinho para lá e para cá, uma negociação, ainda mais se o livreiro percebe com clareza que é material raro e valioso que o cliente tem para oferecer.
Ao trabalhar em um sebo percebi com maior clareza, o procedimento do livreiro ou o encarregado em fazer a avalição, isto, quando os livros implicam em uma visita ao local para fazer o frete da mercadoria; na livraria em que trabalhei o livreiro não dispunha de transporte próprio, trazia de táxi, no contato seja pessoal ou por telefone, o livreiro geralmente procura saber qual a quantidade de livros (uma estimativa) e os assuntos, muitos são os livreiros que não trabalham por exemplo com livros jurídicos, ou de medicina. Geralmente é avaliado pelo valor mais baixo até o limite que o livreiro tem disponível para oferecer. Há muitas livrarias que aceitam troca, geralmente, são 2 ou 3 livros por um, há outra opção, estipula-se um valor X para ser trocado em livros. Por falar em preço de livros em sebos, houve pelo que constatei um considerável aumento para venda dos livros. Geralmente os livros didáticos de 1º e 2º graus são recusados, alguns jurídicos, para livrarias da zona sul, não são receptivos. Hoje com toda certeza, o comércio que oferece maiores condições de trabalho e lucratividade é o segmento de livros usados. Convém registrar que há bons sebos e bons livreiros. O sebo, entendo e não convém esquecer, como uma das vias de formação de um profissional do livro, claro que existem outros pré-requisitos nesta formação. Para se formar um livreiro, leva-se um tempo. O primeiro deles, é gostar de livros e que implica de imediato em gostar de ler. O livro tem de ser tratado com carinho, com cuidado, com zelo, diria mesmo com sabedoria.
Sempre freqüentei sebos, desde do período em que cursava Ciências Sociais nos anos 70, no Largo de São Francisco, depois ou antes da aula, ia em busca dos tesouros de minha área de interesse, encontrava com as maiores preciosidades literárias de diversos quilates. Gostava muito de periódicos, das revistas pertinentes às ciências sociais. No circuito dos sebos localizados no centro sempre estava em companhia de meu querido professor Aluizio Alves Filho, grande Mestre e Doutor em Ciências Politicas, o homem é provedor de múltiplo saber, conhece tudo sobre: Brasil, Ciências Sociais e Politicas, Monteiro Lobato e Oliveira Viana; um intelectual e escritor com vários livros editados, além de enorme bagagem. Aluizio é um tremendo bibiliófilo, sua biblioteca, é um multiplo acervo sobre o nosso país com uma ligeira tintura para a concentração em Política; quem chegou a conhecer como eu, garante que é um dos melhores acervos em nossa área, na ocasião era despontada como fantástica. Quando não saíamos juntos da faculdade, nos encontrávamos em algum sebo, ou éramos avisados que um ou outro havia passado por ali. O mestre tem um bom faro para preciosidades e raridades, aprendi muito com Aluizio, não é à toa que é um mestre.
O ultimo sebo que visitei na cidade, quando trabalhei com meu sogro, até o ano de 2002, foi a Livraria Brasileira, fundada em 1972, pelo livreiro Oscar Muller, localizada no Edifício Central. Considerado um dos mais tradicionais sebos do Rio de Janeiro, algum tempo depois, li pela imprensa que foi despejado.Foram para outro local. Lembro que comprei o livro O Pais da Bola, editado em 98, pela Record, de autoria de Betty Milan. Nesta ocasião estava catando livros sobre futebol, amadurecia a idéia em fazer algo acadêmico nesta área, haviam dois colegas sociólogos que estavam envolvidos com a especialização sobre futebol, levando adiante o Núcleo de Sociologia do Futebol na UERJ, um era Mauricio Murad, vascaíno e o outro o flamenguista Ronaldo Helal. Cheguei a comprar um dos exemplares da revista Pesquisa de Campo, editada pelo núcleo. Tempos depois, acabei por descartar este projeto, nele estava incluido um estudo sobre o Vasco, sobre a identidade portuguesa, um clube da colonia portuguesa, etc, etc ...
Na livraria de Copacabana ainda percorri algumas seções, olhei algumas prateleiras de literatura brasileira, me interessei pelos livros de Lia Luft e um de Heloísa Seixas, pensei em deixar reservado, desisti e passei para as Ciências Sociais, que atualmente voltei a ter interesse encontrei o livro que me interessava muito. O sebo tem disto, de repente, encontra um livro que se procura, o pior já tive o livro, fui divulgador da editora nos anos 70/80 e fui seu pracista através da Vários Escritos; incrível foi o primeiro livro que encontrei na seção, assim, como se estivesse caído do céu. Comecei a reler e está sendo proveitoso para uma idéia que acalento de uns dois anos prá cá, que é a historia do mercado editorial, o escritor foi dono de uma editora nos anos 60 onde publicou a maioria de seus livros e que foi fechada pela ditadura; publicou sob pseudônimo seu livro em uma editora de esquerda nos anos 30 e que foi fechada, foi o responsável pela fundação, organização e um dos editores, de uma editora de esquerda que foi fechada também pela ditadura militar de 64.
Uma boa notícia, recebi pela manhã, um convite de um amigo para trabalhar na rua com livros usados, aceitei de imediato, para mim, foi um remédio para o corpo e o espírito, começo amanhã, com o pé direito e a enorme vontade de voltar atuar no comércio de livros. "Alea jacta est"







Aécio de Andrade - Artista Naïf, autodidata, nasceu em São Paulo. Para mais detalhes consultar o site Art Canal