Manhã Chuvosa
Naquela manhã chuvosa, avistei escondido no espelho refletido dos meus olhos,onde brilhava por raios solares, uma linda imagem desenhada. De uma mulher desnuda, envelhecida e de lábios rubros. Exalava o aroma dos perfumes de outrora, das flores e dos amores.
Abri uma das portas e caminhei... por onde? Não sei! Apenas sei, que pulei à cerca que envolvia o meu corpo. E parti em sua direção para colar meus beijos em seus belos seios coloridos de carmim. Com um sorriso de um colorido estampado, abraçou o tempo. Fitou meu corpo e algemou meu braço nos contornos de seu corpo esbelto.Fechei bem os olhos abertos. Teci o sonho.Tive o desejo construido num emaranhado dos traços de Zéfiro.
Convidei-a para dançar nos salões de meus pensamentos delirantes.É um convite? Sim! é um convite. Seus cabelos presos ao vento, deslizavam em minha face molhada por respingos suados do seu corpo ardente. Eram movimentos desordenados e descontraídos. Ainda guardados. Lembro! Não poderiam ser esquecidos. Desmanchava os lençóis feitos de retalhos que cobriam os meus desejos. Das janelas emperradas e desbotadas, que pintei e deixei na moldura exposta dos muros da sala. Decoravam o vazio Dali, recortei os acordes soluçantes que suspiraram ao sabor daquelas rimas mal escritas em Garamond, no calor das tardes insones.Rascunhei meu inconsciente. Comecei a me despir, colocando os meus sonhos entre as sua coxas roliças.Coloquei na vitrola defeituosa o ritmo portenho de Gardel, “El dia que me quieras// endulzará sus cuerdas// el pájaro cantor, Florescerá la vida // No existirá el dolor.// La noche que me quieras.” por Astor Piazzola, viajei. Tingi o tempo em cores transparentes. Juntei cacos pontiagudos deixados ao léu.
Reminiscências guardadas no escaninho da vida remoída, dissolviam no tempo. Folhas mortas escritas e espalhadas ao vento, remendavam os traços de minha existência. Balançava aquele corpo diante de mim. Tateava os traços dos contornos definidos pelos dedos ofegantes
Vamos! Aproveite os instantes e rasgue o chão de meu coração, pavimentado pela ilusão. Derrube os tijolos das paredes de meu corpo. Coloque o Gato Negro Sauvignon perto daquelas taças. Brindemos nossos corpos, misturando salivas e gozos. Degustei aquele líquido que trasngredia na excitação prazeirosa, que me parecia sem fim.
Exausto, adormeci nos braços da noite vazia, depois, de ser alimentado das tardes enluaradas esquecidas em meu prato vazio. Nas prateleiras de meus pesadelos divertidos, cochilei. Desperto, desconecto meu sexo de meus dedos. Beijo o sonho guardado onde visto o meu agasalho de aço. Protejo das incertezas, os meus desejos entrelaçados pela minha vontade pintada nas cores daquela mulher envelhecida. Acompanhei o seu tempo, envelhecido também estou.Somos iguais, sendo diferentes. Os objetos secretos arremessados no vazio de meu quarto de despejo. Continuam secretos...Ali, o espaço solene das lamúrias do tempo, recôndito da intimidade costurada na felicidade dos encontros clandestinos, pendurava sempre nos cabides do armário.
Caminhei cambaleante pelas estradas sinuosas de seu corpo. Encontrei o meu destino carregado na boléia de seus braços. Para dar apertados abraços. Nos desencontros marcados no momento das horas daquele velho relógio sem ponteiros. Debrucei na esperança. Embrulhei as rugas temerosas e inquietantes no meu corpo envolto de papel celofane. Atados, em nós de nossas pernas, dos dedos e troncos, cruzamos em nossos lábios, os prazeres alcançados em gritos e sussurros. De novo. Entre quatro paredes exilei este momento.
Olho a lua minguante pelas frestas que iluminam os descaminhos de meus passos.Acendo a luz e apago a “máquina de fazer doidos”, que está ligada ao meu cotidiano.Quando olhei para o céu, a noite, virou dia. Saio em busca do sol, que derrete meu corpo marcado pelo tempo. Atravesso as ruas transversais, vazias de gentes e carros. Passou por mim, apenas, aquela mulher desnuda e envelhecida. Não olhou para mim. Olá, com vai? Lembrei de Paulinho da Viola, “me perdoe à pressa, vou pegar meu lugar no futuro”. Assim, por caminhos, que faço ao andar.Esbarro nos encontros oníricos e dos desejos que atravessaram o meu ser. Penso em trazer aquela mulher para os meus pensamentos no dia seguinte.
Feliz e muito, por ser um outro dia. Nada melhor, do que um dia após o outro. Aquela manhã de sol enluarado. Ondas beijando os corpos dos banhistas, das crianças alegres,outras abandonadas e tristes; dos peixes. e sereias formosas, algumas envelhecidas como eu, que mergulham...no imenso mar salgado. Barcos, navios,redes e pescadores são adereços desta paisagem. Eu, me levantei e resplandeci em meu silêncio, terminei de ler a última página em branco do livro “As Horas Nuas”... Sorri para Lygia. Olhei, para a placa luminosa pregada na esquina. Acelerei então, os passos. Entrei na Quitanda e ali permaneci...
Wilton Chaves
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