sexta-feira, junho 03, 2005
Uma conversa silenciosa com Drummond
Escultura do poeta Carlos Drummond de Andrade, criada pelo artista mineiro Leo Santana. Instalada em Copacabana, em frente à rua em que o poeta morou, no dia 31 de outubro de 2003 - Cententenario do Poeta.
Caminhava conversando com o vento pelo calçadão
seguindo sem lenço e com documentos
com os olhos cheios de cores, vidrados
naquela maravilha de cenário.
Dos corpos dourados das mulheres de Copacabana
deitadas como sereias, nas areias banhadas de sol,
beijadas por homens, ondas e ventos.
Dos homens e crianças sorridentes sem dentes
da cola que cheiram e brincam indiferentes.
Pega! Pega Ladrão! Grita aflito alguém chorando
a carteira voava entre pivetes, facas e canivetes.
Armas do desejo de possuir.
Roubam e atravessam sorridentes e triunfais;
sou di menor, tio me dá um real.
Vou seguindo em direção ao Posto Seis.
Peço uma licença poética, ao Meu Amigo Poeta
para um dedo de prosa.
Meu amigo, respeito o seu silêncio, mas a infância está perdida.
A mocidade está perdida, mas a vida não se perdeu...ainda.
Naquela avenida abraçada pelo mar
os hotéis sorriem de felicidade.
Turistas perdidos procuram as damas da noite
e os gays da vida, na vida, perdidos na noite,
paqueram aqueles que vivem aqui em Copa e de Copa.
Olha Poeta, em seu silêncio
a paisagem encarnada e ventilada pelos odores
dos corredores, dos caminhantes, dos ciclistas e golpistas;
Copacabana você não me engana, não disse assim Fontoura, mas disse
Caetano e Torquato, nesse país que me engana, aí de mim, Copacabana, aí de mim,ai de mim, ai de mim...
Copacabana virou filme da Carla Camurati, Ai de ti, Copacabana! dizia Rubem Braga, porque a ti chamaram Princesa do Mar.
Porque eu já fiz o sinal bem claro de que é chegada a véspera
de teu dia...estás perdida e cega no meio de tuas iniqüidades e de tua malícia.
E agora, Carlos?
Você sentado eternamente neste banco
poetando este mundo caduco.
Sei que no meio do caminho tinham aquelas
pedras do calçadão e bicicletas na contra-mão.
Tinha a policia descansando, porque ninguém é de ferro.
Carlos, eu confesso, nunca esquecerei desses acontecimentos:
Tinha um corpo estendido no meio do caminho
no meio do caminho tinha um corpo drogado.
Um menino revoltado. Meninas vendendo balas.
Das gaivotas em cambalhotas.
Mar me fez amar Copacabana
pra se amar, um só lugar, Copacabana
cantava Lúcio Alves em 1951;
Princesinha do Mar
Só a ti Copacabana eu hei de amar.
E agora, Carlos?
Lula , esqueceu que foi operário e foi viver no Paraíso
virou amigo de reis e príncipes e afastou os mendigos.
A festa não acabou , a miséria continuou.. As luzes estão
acesas nos quiosques, na praia, nos faróis.
A bebida rola e outras coisas que nem queira saber.
Copacabana sempre nos engana. Do Leme ao Posto 6.
Lembro, Carlos quando você passava por mim, nos anos 80
de braços dados com Maria Julieta pelas calçadas de Ipanema.
Soube que você ficou muito triste com a partida de sua filha,
ela foi pra não voltar e você,depois,seguiu seus passos...
Eu estava do outro lado do balcão de uma livraria
daquele cineasta que dirigiu: Amei um bicheiro.
Ele também foi embora, deixou um livro escrito pela Rosana Cardoso,
que começa,citando seus versos:
É preciso que a lente mágica
Enriqueça a visão humana e do real de cada coisa
Um mais seco real extraia para que penetremos fundo
No puro enigma das figuras, está escrito em Amar se aprende amando.
E agora, Carlos?
A festa não acabou, mal começou.
Copacabana me enganou
e um anjo meio torto, destes
que colocam o boi na sombra disse:
vai, Wilton, ser de esquerda na vida
militante dos sonhos, dos protestos estudantis,
acabei sendo sociólogo, livreiro, distribuidor e editor.
Até uma locadora criei de nome Sagarana.
Dona Vanna Piraccini, uma grande livreira, você conheceu muito,
sei que você estava sempre por lá... Leonardo, era sua passagem,
continua sendo uma excelente livraria. Faz parte da história do livro.
Lembra da campanha que você fez através do JB?
Conclamando os clientes a pagarem as contas,
por causa daquele incêndio criminoso na livraria,
queimando tudo, arquivos e livros, foi no ano de 1973.
Você chegou a fazer poema em homenagem a livraria:
Ao termo da espiral que disfarça o caminho com espadanas...
Quem quiser saber mais que leia as Impurezas do Branco.
Meus olhos e os seus seguem
As bundas bronzeadas, as boas de bunda. Uma bela bunda,
Não sei se seria da Raimunda.
Que além de ser rima é solução
Aquelas que parecem sorrir.
São engraçadas.Esferas harmoniosas sobre o caos
A bunda são duas luas gêmeas
Em rotundo meneio
A bunda é a bunda.
Sabe meu querido poeta
elas nos divertem...Sei que você dedicou
Um Amor Natural para elas.
Lembra Carlos, daquela que pelo rádio da polícia,
ela mandou o seu recado, Kátia Flávia, gostosona
que só usa calcinhas comestíveis e calcinhas bélicas.
A Godiva de Irajá que se escondeu aqui em Copa.
Uma Louraça Belzebu, provocante, disse a Fernanda Abreu
uma vascaína igual a nós. Lembro que publicou vários assuntos sobre futebol.
Quando é dia de futebol, virou título de um livro.Quem reuniu esta seleção de textos, foram os seus netos, achei muito legal esta iniciativa.
O nosso time esta um vexame só.
É governado pelo Tirano da Colina.
Poeta, quantas pessoas sentam ao seu lado
passam aqui para conversar e ouvir poesia
ou apenas fotografar.
Carlos, a Rosa ainda não é do povo, continua com os espinhos
mas elas falam, reclamam, protestam.
Carlos, a coisa aqui, tá preta como disse outro poeta.
O outro, poeta-cantor largou a Marieta.
Mas o que queria lhe dizer; é que continuamos
na luta, na luta... sem pedir licença.
Os poderosos estão cada vez mais ricos.
Os idosos, estes que tiram fotos de você
ainda continuam penando nas filas dos postos da previdência,
nos hospitais. Cresce o número de moradores de rua.
Sei que os seus olhos não perguntam nada,
apenas olham para as pernas brancas, pretas e amarelas.
Por que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Pois é poeta, pernas pra que te quero?
Olha poeta, que rabo muito gira, é de uma portuguesa com certeza,
reparei no sotaque enquanto caminhava olhando Las Muchachas de Copacabana.
Mamãe pro mês lhe mando umas economias Lembrança da filha
Que brilha aqui na capital. É uma estrela internacional
Esta é de autoria do Chico, que continua cada vez melhor...escrevendo livros e suas
Composições, fazendo show. Poeta, adivinhe, onde? Na praia, até uma Inocente do Leblon.
Foi ouvir bem de perto, parece que era um papo animado.
O Arnaldo, sim, o Jabor, anda fazendo meditações diante de um bumbum.
O bumbum da Juliana Paes, você meu querido poeta acho que não conheceu
é uma celebridade da tv, uma artista de novela.
Foi capa de revista Playboy.
E agora, Carlos?
Continuamos morando em Copa, você em um posto
eu, em outro. Moro na metade do seu.
Carlos, quase que ia esquecendo de lhe contar:
Há mulheres colocando silicone, no considerado patrimônio nacional
fazem cirurgia pra aumentar os glúteos, mas prefiro bunda ao natural, acho melhor.
Quero lhe apresentar a puta da cidade, que você falou certa vez.
Ouvi dizer que João amava Pedro
Que amava Teresa que não amava Raimundo. Raimundo que amava Maria
Que saiu da casa da tia e Joaquim que não estava nesta história, acabou mesmo
Suicidando, se jogando de um prédio na esquina de Figueiredo com Domingos.
Um escrito na sala do apartamento de Copacabana, escrito que não engana
Arregalou os olhos de Sebastiana, assim, cantava Eduardo Dusek.
Carlos, quem está distante de nós, é uma doce e querida amiga Elianne, trocou Ipanema
por Cabo Frio, voltou para Ipanema e foi para Natal., levando livros e filhos...
Deixou lembranças...É o nosso amor antigo, nada exige e nem pede...
Carlos, agora, meu caro poeta, vou para casa. Pretendo acordar sem sofrimento.
A dor que deveras sinto, é a dor de não ser um poeta, nem prosador do mundo.
Sou apenas um leitor e agora blogueiro. Com o abraço de sempre
desse quitandeiro, velho apreciador de livros.
Seu admirador.
Obs: Foram consultadas algumas poesias de Carlos Drummond de Andrade em páginas na web como: Drummond: Alguma Poesia e Casa do Bruxo. Versos de Drummond foram inseridos na elaboração deste texto, assim, como os autores citados e suas composições musicais. Esclareço que é uma homenagem singela e sincera ao poeta que sempre via passar por mim e que hoje passo por ele....em sua forma de escultura na Praia de Copacabana, posto 6. O que escrevi,dedico para Marilene, minha companheira por mais de 30 anos, ao filho Raoni, ao seu filho, meu neto Ramom e a minha querida amiga Elianne Abreu..
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