quinta-feira, junho 02, 2005

Uma Poetisa dos Anos 80 : Ana Cristina Cesar


Flavio de Carvalho - Escritor, Desenhista, Cenografo, Engenheiro - 1899/1973 -  Posted by Hello

Hoje, por uns momentos, sentado diante desta tela, lidei com a falta de assunto. Fiquei paralizado. Os minutos passavam ligeiros por mim, sem me dar muita atenção.Eu continuava na minha...As idéias circulavam e eram apagadas tão rápidas quanto surgiam. Acabei por remexer no passado. Peguei alguns atalhos e fui direto para os anos 80. Lembrei dos tempos em que caminhava pela Rua Visconde de Pirajá, rumo à livraria que montei com as cores da esquerda.Eu, sociólogo e antigo militante do partidão, os outros dois, de organização revolucionárias diferentes, mas que foram trocados pelo embaixador.Tinham chegado há pouco tempo, do exílio.
Eu morava no Posto 6,na Raul Pompéia, em Copacabana.Era um sacrificio esta caminhada, pois, eu estava acima do peso e fumava.Foi no ano de 1983, que tomei uma grande e sábia decisão de parar de fumar. Decidi, após, uma consulta ao meu cardiologista,na época, Dr. Carlos Scherr.Foi no último dia do mês de outubro, quando na esquina da Rua Aníbal de Mendonça, onde estava situada a minha livraria. Atravessei à rua e dei alguns passos em direção ao edificio Top Center. Ouço o meu nome, sou chamado por uma amiga e cliente, dona de uma academia de ginástica. Veio me avisar, que tinha ouvido a triste notícia do suicidio de uma poetisa, no fim de semana. Ao pronunciar o seu nome,fiquei chocado, mesmo não a conhecendo, apreciava o seu trabalho intelectual e seus escritos na imprensa.Tive conhecimento de outros livros de sua autoria.
Desenvolvia intensa atividade jornalistica. uma mulher com uma rica trajetória, uma jovem brilhante. Adorada e admirada por muitos. Tanto, que eu vendia suas poesias regularmente. Lembro que foi editado pela Brasiliense no ano de 1982, na coleção Cantadas Literárias,volume 8, o seu livro de poesia/prosa A teus pés.Sucesso de vendas, havia uma procura,que determinou a segunda edição.A Brasiliense, também, era sucesso em vendas, a editora da moda. Lançou em 1977, um jornal especializado em livros, o Leia Livros. O nome desta poetisa, era Ana Cristina Cruz Cesar - Ana C, como era conhecida. A noticia recebida por mim, foi dada no dia 31 de outubro de 1983. Fui me inteirar do assunto e confirmei, que ela morreu com 31 anos, no dia 29 de outubro, em um sábado à tarde.
Verificando o calendário, hoje é a data de seu nascimento.Filha de um cliente da livraria Francisco Alves,na Rua Farme de Amoedo, onde trabalhei . O seu pai, o sociólogo Waldo Cesar,autor de estudos sobre religião.Waldo César, pelo que sei foi um dos fundadores da Editora Paz e Terra, pertenceu ao conselho editorial, junto com intelectuais marxistas e católicos. A produção editorial da Paz e Terra, aponta para este conteúdo em sua fase inicial. Depois de algum tempo com dificuldades financeiras e perseguida pela censura, resolveram vender para o empresário Fernando Gasparian, que manteve um perfil de esquerda. Com excelente catálogo na área de ciências sociais.A editora Paz e Terra, também produziu uma revista,nesta fase inicial.A censura estava atuante.Fazim estragos.Algumas bombas explodiam.
Gostava muito desta fase,eu que estava envolvido com livros 24 horas, vivi em ambiente de livros. Montei durante a minha formação uma grande biblioteca na área de ciências sociais.Os sebos foram os caminhos para a realização deste acervo.Uma vacilada minha nesta época, era ter lido muito pouco a literatura ficcional.Preferia sempre a literatura especializada.
Olhando pelo retrovisor, perceberemos que foi uma fase muito rica em periódicos,seja revistas ou jornais. Não convém esquecer, da importância da editora Vozes,de sua revista. Uma das editoras e livrarias resistentes ao regime ditatorial.A importância do frei Luis e da editora Rose Marie Muraro, uma fantástica e brilhante mulher, extremamente inteligente, figura importante na história do livro. Trabalhei com Rose(ela sofria um problema sério de visão) na editora Espaço e Tempo, junto com o editor Fernando Sá. Resolvi me afastar aos poucos da editora, com a entrada do "expert" em livros, realmente, um profundo conhecedor de livros, o senhor Gustavo Barbosa, um expoente intelectual da comunicação.Já conhecia esta sumidade, quando trabalhei na Edições Graal. Havia, até então um bom ambiente na editora, uma boa equipe: trabalhava Antonia, uma das filhas de Rose,a irmã do goleiro Paulo Vitor, que foi do Fluminense, o escritor e antigo militante da VPR, Herbert Daniel, que presidiu o grupo Pela Vida e dirigiu a ABIA. Morreu vítima da AIDS, aos 45 anos, em 1992 e seu companheiro, anos depois, vitimado pela doença, lembro agora apenas do primeiro nome, era Claudio.Conheci apresentado por Rose e Fernado, alguns autores da casa,como Eliane Maciel, o sexólogo Marcos Ribeiro, Sylvia Orthof(1932/1997) moradora de Petropólis e autora de diversos livros infantis, junto com o marido que fazia a ilustração. Escreveu sob pseudônimo, o Livro da Sorte, êta livrinho, vende muito,ao cientista politico uruguaio Rene Armand Dreifuss(1945/2003)
Tenho uma vaga noção da participação do Ênio Silveira na Paz e Terra, acho que ele mantinha algum vinculo, creio ter sido o fio condutor da embrionária editora. Sei que no conselho editorial, eu gostava de examinar um por um, havia uma pluralidade de intelectuais, como: Maria Helena Kühner,um católico mineiro, o intelectual Edgar de Godoy Matta Machado, Jânio de Freitas, Luiz Eduardo Wanderley, Alfredo Bosi,creio que o Moacyr Félix, também. Enfim, muita gente da melhor qualidade.Poderia se dizer, que a Paz e Terra, nesta fase, era uma editora ecumênica.
Mas como hoje é a data de nascimente de Ana Cristina Cesar, gostaria apenas de trasnscrever estes versos, mas quero registrar de quem cuida do material da poetisa, é o poeta Armando Freitas Filho e se não me falha a memória, a professora, escritora e editora Heloísa Buarque de Hollanda. Foi consultado o livro de Ana Cristina César, Escritos no Rio, editado pela Editora UFRJ/Editora Brasiliense e o site Reduto Literario

SONETO

Pergunto aqui se sou louca
Quem quer saberá dizer
Pergunto mais, se sou sã
E ainda mais, se sou eu

Que uso o viés pra amar
E finjo fingir que finjo
Adorar o fingimento
Fingindo que sou fingida

Pergunto aqui meus senhores
quem é a loura donzela
que se chama Ana Cristina

E que se diz ser alguém
É um fenômeno mor

FISIONOMIA

não é mentira
é outra
a dor que dói
em mim
é um projeto
de passeio
em círculo
um malogro
do objeto
em foco
a intensidade
de luz
de tarde
no jardim
é outra
outra a dor que dói

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